Exatamente neste momento (22.40) no Coliseu de Lisboa canta-se a uma só voz. Lotação esgotada. Assistência sedenta de participar para recordar Zeca Afonso, cantar Grândola, respirar laivos de liberdade como há 40 anos aconteceu poucos dias antes do 25 de Abril. É um elenco de luxo que está ou vai atuar ainda. Impossivel convidar para que "venham mais cinco" porque o espaço está a abarrotar de pessoas, de amigos, de companheiros e camaradas. Respira-se dentro do Coliseu sinergias da revolução. Durante os ensaios, hoje à tarde, a TSF realizou uma reportagem sobre este evento. A seguir. (Redação PG)
Coliseu de Lisboa esgotado para "Cantar Grândola" 40 anos depois do primeiro encontro
TSF - 17:50
O concerto
"Cantar Grândola, 40 anos depois", evoca hoje, num Coliseu de Lisboa
já esgotado, o espetáculo de 29 de março de 1974, com músicos como Sérgio
Godinho e Janita Salomé, que voltam a cantar José Afonso. Já se ensaia no
Coliseu.
Mais de vinte
artistas portugueses e espanhóis sobem ao palco do Coliseu de Lisboa para
recordar o I Encontro da Canção Portuguesa, que aconteceu há quarenta anos,
nesta mesma sala, onde se entoou a canção "Grândola, Vila Morena", do
autor de "Contos velhos, rumos novos".
De acordo com Vítor
Sarmento, da Associação José Afonso, entidade organizadora do evento, a procura
superou as expectativas e o Coliseu de Lisboa esgotou há pelo menos três dias.
«No dia do
espetáculo [em 1974], a censura avisara a Casa de Imprensa, organizadora do
evento, de que eram proibidas as representações de 'Venham Mais Cinco', 'Menina
dos Olhos Tristes', 'A Morte Saiu à Rua' e 'Gastão Era Perfeito'. Curiosamente,
a 'Grândola' era autorizada», recorda agora a Associação José Afonso.
Mais tarde,
militares do Movimento das Forças Armadas viriam a escolher aquela música de
Zeca Afonso - gravada para o álbum "Cantigas do Maio" (1971) - para
senha da revolução, em parceria com os responsáveis do antigo programa
radiofónico Limite, emitido pela Rádio Renascença, que a transmitiu, na
madrugada de 25 de Abril de 1974.
Além de Zeca
Afonso, nesse espetáculo participaram músicos e autores como Adriano Correia de
Oliveira, José Carlos Ary dos Santos, Carlos Paredes, Fernando Alvim, Fernando
Tordo, José Jorge Letria e José Barata Moura, o grupo Introito, de Nuno Gomes
dos Santos, e Manuel José Soares.
De acordo com
testemunhos da época, mais de cinco mil pessoas assistiram ao concerto de 1974,
que se realizou sob forte vigilância da polícia, como Otelo Saraiva de Carvalho
lembrou mais tarde em "Alvorada em Abril". A canção "Grândola,
Vila Morena" ecoou então espontaneamente, como ato de resistência.
Quarenta anos
depois, o elenco do concerto será diferente, com mais de vinte artistas, a
maioria portugueses, como Sérgio Godinho, Júlio Pereira, Amélia Muge, João
Afonso, António Victorino d'Almeida e Luiz Avellar, Filipe Raposo, Francisco
Fanhais e Zeca Medeiros.
A eles juntam-se
ainda Manuel Freire e Carlos Alberto Moniz, que estiveram há 40 anos no
Coliseu, e os espanhóis Antonio Portanet, autor de "Vals en las
ramas" e "Noche de quatro lunas", e Esther Merino, que já
participou no Festival de Flamenco de Lisboa.
No espetáculo de
hoje são ainda esperados Couple Coffee, Amílcar Vasques-Dias e Luís Cunha,
Luísa Amaro e Rui Pato, que acompanhou José Afonso, no início dos anos 1960.
Em declarações à
agência Lusa em fevereiro passado, Manuel Freire recordou o concerto
emblemático de 1974: «Uma coisa bastante vibrante, ver o coliseu completamente
cheio a cantar aquela música».
«Andávamos com o
Zeca, conhecíamos a música, mas não tínhamos a pequena ideia de que aquilo ia
acontecer [no Coliseu]», recordou.
O músico lembra que
havia recomendações para «não levantar muitas ondas porque a polícia de choque
estaria à saída» do Coliseu, mas «as mensagens eram cifradas e as pessoas estavam
já treinadas para as decifrar».
O I Encontro da
Canção Portuguesa realizava-se cerca de duas semanas após o levantamento das
Caldas da Rainha e a menos de um mês da madrugada de Abril.
"Cantar
Grândola, 40 anos depois" é organizado pela Associação José Afonso em
colaboração com a Casa da Imprensa.