sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

HAITI – UM PAÍS INVISÍVEL



REDESCOBRIR A HISTÓRIA

Martinho Júnior, Luanda (ler parte antecedente - HAITI – A APOSTA PELA VIDA

4 – De entre as coisas que a contra revolução liberal pretende ocultar, em função das ideologias e das práticas por que se nutre no âmbito do “mercado global” dominado pelos oligopólios, pelos cartéis e pelos seus cada vez mais mercenários instrumentos de opressão, está a própria história!

Interessa à ditadura do capital e ao fascismo concomitante que por seus decretos a história seja abolida, para ser esquecida tal qual ela é e, em sua substituição, seja inventada a mentira na base de seus exclusivos interesses e de suas egoístas conveniências!

Para o caso do Haiti não é preciso decreto: esquecer a sua história é o que tem acontecido desde a sua independência… mais um feito glorioso da “civilização ocidental”!

Daí que o Haiti, conforme ainda Eduardo Galeano, é um “país invisível”, em relação ao qual de há muito vêm apagando a memória!...

5 – É evidente que a história de Haiti é importante para África, desde os tempos da escravatura!

É uma história que deveria figurar nos compêndios escolares do continente-berço, que se deveria ensinar desde logo às crianças, para que os adultos estivessem minimamente avisados… mas África é precisamente um dos continentes em que a epopeia do povo haitiano é menos lembrada… não vá a memória contagiar e fazer mexer com os povos, que se querem adormecidos, anestesiados e… submissos!

É só constatar a proliferação das religiões “importadas” por África, surgidas em tempo de “mercado”: o tempo que a atenção a elas é devotadamente entregue por tantos milhões de cordeiros… e comparar com a ignorância completa em relação ao Haiti, cuja história deveria estar presente em África, para se poder avaliar da oportunidade dos resgates contemporâneos que há que realizar em nome da paz, do aprofundamento da democracia, do equilíbrio e da justiça social imprescindíveis!

Por isso Eduardo Galeano ao fazer ao seu jeito peculiar a recuperação da memória relativa ao Haiti, tem imenso mérito no seu reparo que não pode ser mais um acto singular, por que essa memória é um património inalienável para toda a humanidade… para os encontros e reencontros que deveremos assumir em toda a humanidade:

… “De todo eso sabemos poco o nada.

Haití es un país invisible.

Sólo cobró fama cuando el terremoto del año 2010 mató más de 200 mil haitianos.

La tragedia hizo que el país ocupara, fugazmente, el primer plano de los medios de comunicación.

Haití no se conoce por el talento de sus artistas, magos de la chatarra capaces de convertir la basura en hermosura, ni por sus hazañas históricas en la guerra contra la esclavitud y la opresión colonial.

Vale la pena repetirlo una vez más, para que los sordos escuchen: Haití fue el país fundador de la independencia de América y el primero que derrotó a la esclavitud en el mundo.

Merece mucho más que la notoriedad nacida de sus desgracias”…

6 – A “civilização ocidental” só se lembra do Haiti, precisamente por causa de nele subsistirem as velhas religiões africanas, tirando partido também do Haiti se ter tornado num beco, num acantonamento, em relação ao qual o império tira partido das condições físico-geográficas no terço ocidental da Hispaniola:

… “El cruce de la frontera entre la República Dominicana y Haití se llama El mal paso.

Quizás el nombre es una señal de alarma: está usted entrando en el mundo negro, la magia negra, la brujería...

El vudú, la religión que los esclavos trajeron de África y se nacionalizó en Haití, no merece llamarse religión. Desde el punto de vista de los propietarios de la civilización, el vudú es cosa de negros, ignorancia, atraso, pura superstición. La Iglesia Católica, donde no faltan fieles capaces de vender uñas de los santos y plumas del arcángel Gabriel, logró que esta superstición fuera oficialmente prohibida en 1845, 1860, 1896, 1915 y 1942, sin que el pueblo se diera por enterado.

Pero desde hace ya algunos años las sectas evangélicas se encargan de la guerra contra la superstición en Haití. Esas sectas vienen de Estados Unidos, un país que no tiene piso 13 en sus edificios, ni fila 13 en sus aviones, habitado por civilizados cristianos que creen que Dios hizo el mundo en una semana.

En ese país, el predicador evangélico Pat Robertson explicó en la televisión el terremoto del año 2010. Este pastor de almas reveló que los negros haitianos habían conquistado la independencia de Francia a partir de una ceremonia vudú, invocando la ayuda del Diablo desde lo hondo de la selva haitiana. El Diablo, que les dio la libertad, envió al terremoto para pasarles la cuenta”…

Essa é também uma das razões da implantação da base militar de Guantánamo, tornada prisão por parte do império, num dos recantos mais orientais de Cuba: é simultaneamente um constante “aviso” em relação à revolução cubana e ao tradicionalmente insurgente Haiti, que lhe fica tão próximo!

Guantánamo tem seu próprio poder “sugestivo e persuasivo” enquanto prisão: contribui para que o império mantenha a pretensão de tornar Cuba e o Haiti como países bloqueados e, na medida do possível, “invisíveis”!!!

Gravura: Quadro dum pintor haitiano contemporâneo e não referenciado.

Artigos publicados por Martinho Júnior:

Outras consultas:

Dificuldades contemporâneas da integração entre antigas repúblicas soviéticas e UE




Qualquer expansão que inclua países da URSS criaria tensões com a Rússia. Isso é algo que a UE não precisa nesse momento

Kai Enno Lehmann*, São Paulo – Opera Mundi, em Duelos de Opinião

Entrar na União Européia é uma boa solução para as ex-repúblicas soviéticas? NÃO

Boa ideia, tempo errado?

Olhando para a Ucrânia nesse momento – com mais de 15 mortos em confrontos entre as forças de segurança e manifestantes, somente na terça-feira (18/02) – vale a pena lembrar que as manifestações nesse país se iniciaram por causa da decisão tomada pelo governo da Ucrânia de suspender as negociações com a União Europeia sobre um acordo de associação que teria incluído um acordo de livre comercio entre os dois lados. Ao invés disso, o governo do presidente Yanukovitch decidiu buscar uma relação econômica e política mais próxima com a Rússia.

A situação dramática em Kiev nos leva a considerar uma pergunta mais ampla e estratégica que se aplica, não somente à Ucrânia, mas a várias outras ex- repúblicas da União Soviética que hoje são estados independentes: entrar na União Europeia é uma boa solução para esses países tanto economicamente, quanto politicamente?

Em termos econômicos, a resposta parece mais fácil. Apesar da sua crise, a União Europeia ainda representa um mercado comercial extremamente importante e atraente para países geograficamente próximos e com profundas necessidades econômicas, como é o caso da Ucrânia. De fato, levando em consideração o tamanho e a proximidade do mercado europeu, algum tipo de relação comercial com a União Europeia seria quase inevitável.

Dito isso, mesmo no campo econômico, a questão não é tão simples. Por exemplo, em 2012, mais de 60% das exportações ucranianas foram para outros estados ex-soviéticos, mostrando a importância que o lado oriental tem para esse país. Ao mesmo tempo, a crise econômica da União Europeia desde 2008 certamente fez com que esse bloco tenha perdido parte da sua atração. Em 2012, a economia dos países que usam a moeda única europeia mostrou crescimento negativo de 0,5% e alguns dos países da Europa Oriental que faziam parte do orbito soviético e hoje fazem parte da União Europeia ainda não se recuperaram completamente das consequências da crise de 2008. Em outras palavras, o caso econômico para se associar à União Europeia está mais frágil do que alguns anos atrás.

Mesmo se isso não fosse o caso, temos que falar também sobre algumas considerações políticas e estratégicas, principalmente sobre a proximidade da Rússia.

A Rússia, naturalmente e historicamente, tem um enorme interesse nas antigas partes da União Soviética, tendo já perdido, de fato, muita influência sobre os seus antigos estados satélites da Europa Oriental que hoje fazem parte da União Europeia e, em alguns casos, da OTAN também. Ao longo dos anos, esse país mostrou claramente que não tem medo de usar todos os instrumentos disponíveis a ele para defender o seus interesses estratégicos na região e manter influencia, a guerra de cinco dias na Geórgia em 2008 sendo, talvez, o exemplo mais claro, mas certamente não o único.

Com isso em mente, cada governo da região tem que analisar cuidadosamente quais seriam as consequências de uma associação com a União Europeia, seja ela como membro pleno ou em forma de um acordo de associação (como era proposta no caso da Ucrânia). Em termos simples, é crucial ter consciência de que qualquer associação com a União Europeia terá, além do custo-benefício, aspectos não somente econômicos mas,  também, políticos. De fato, levando em consideração a importância da Rússia como fornecedor de energia tanto para a União Europeia quanto para muitas das ex-repúblicas soviéticas, é quase impossível separar os aspectos econômicos e políticos. Eles interagem de maneira complexa e – muitas vezes – imprevisível.

Sendo assim, cada país teria que fazer uma análise de custo-benefício, mas com algumas variáveis desconhecidas de médio ao longo prazo e com a situação contemporânea da União Europeia menos do que ideal. Diante dessas circunstancias valeria a pena assumir os riscos evidentes nos acontecimentos na Ucrânia?

De fato, seria possível fazer um argumento semelhante do ponto de vista da União Europeia. Em termos práticos, por que a organização assumiria, nesse momento, o risco, o trabalho e os custos de incorporar países que serão recipientes dos fundos da União Europeia – ao invés de contribuintes? Por que assumir as dificuldades de adaptar os processos decisórios e as instituições da União Europeia a novos membros, um processo que levará muito tempo e somente mostraria para tudo mundo as tensões internas existentes da União Europeia num momento no qual a organização já sofre com enormes problemas de legitimidade vis-à-vis da sua população, como, sem dúvida, será demonstrado mais uma vez durante as eleições para o Parlamento Europeu em maio desse ano? Por que assumir um processo de adesão que durará anos numa situação onde e quando as necessidades imediatas da UE são enormes?

Essas dificuldades incluem, entre outras, a fragilidade do sistema democrático em alguns desses países (veja a Ucrânia) ou, em outros casos, a inexistência de tal sistema (veja a Bielorrússia, entre outros), mas que é uma precondição básica para qualquer país poder entrar na União Europeia. Nem falamos sobre a dificuldade – talvez a impossibilidade – de decidir quais das ex-repúblicas soviéticas realmente são ‘europeias’ e, assim, elegível para entrar na organização, uma questão que ainda está sendo debatida a respeito da Turquia, décadas depois de esse país ter submetida a sua candidatura para se associar à União Europeia. Como já dito acima, qualquer ‘expansão’ da organização para incluir mais países ex- soviéticos também criaria fortes tensões com a Rússia, algo que a União Europeia não precisa nesse momento.

Obviamente, existem muitos outros fatores que nós não temos tempo de considerar aqui nesse momento. Todavia, somente essas breves considerações acima mostram que buscar uma associação com a União Europeia nesse momento por parte de antigas repúblicas soviéticas traz enormes problemas por ambas as partes o que, ao menos, cria enormes dúvidas sobre os possíveis benefícios de uma associação. Duvido que a União Europeia vá se fechar definitivamente aos seus vizinhos orientais, mas, agora não seria a hora para se abrir. 

*Kai Enno Lehmann é doutor em relações internacionais e professore do instituto de relações internaionais da Universidade de São Paulo


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Ucrânia: PRESIDENTE E OPOSIÇÃO ASSINARAM ACORDO PARA PÔR FIM À CRISE



 TSF

Os líderes dos três principais partidos da oposição assinaram hoje um acordo com o Presidente da Ucrânia, Viktor Ianukovitch, para pôr fim à crise.

O acordo, assinado no palácio presidencial na presença dos mediadores europeus, prevê nomeadamente a antecipação das eleições presidenciais, a formação de um Governo de coligação e uma reforma constitucional que recupere a limitação dos poderes presidenciais da Constituição de 2004.

Os líderes dos três partidos da oposição com representação parlamentar -- Vitali Klitschko, Arseni Iatsenuk e Oleg Tiagnibok - assinaram o documento, assim como os ministros dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Frank Walter Steinmeier, e polaco, Radoslaw Sikorski, segundo a agência France Presse.

O representante da Rússia não assinou.

Os manifestantes da praça da Independência, representados pelo "Conselho Civil de Maidan", aprovaram antes o acordo alcançado, na condição de o ministro do Interior, Vitali Zakhartchenko, não integre o novo Governo e de o procurador-geral, Viktor Pchonka, ser afastado do cargo, ambos pela sua responsabilidade na repressão policial e judicial das manifestações.

O acordo foi alcançado depois de os violentos confrontos entre polícia e manifestantes dos últimos dias terem feito cerca de 100 mortos, segundo números da oposição.

A crise política na Ucrânia iniciou-se há exatamente três meses, depois de Ianukovitch suspender os preparativos para um acordo com a União Europeia, e agravou-se em finais de janeiro, quando se registaram as primeiras mortes, com a aprovação de leis limitando a liberdade de manifestação.

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Itália: O GOLPE FLORENTINO



José Goulão – Jornal de Angola, opinião

É um imitador de Blair com 20 anos de atraso, um copiador das teses de Thatcher, um bisneto dos rapazes de Chicago que inspiraram e guiaram as gentes que serviram o carrasco Augusto Pinochet no Chile

Não surpreende que Matteo Renzi seja um golpista, civilizado por certo porque agora o sangue não escorre das mãos mas das canetas, vedeta de capa fashion da Vanity Fair, feira das vaidades que cabe em todas as línguas, um homem adequado para um anúncio da Old Spice, enfim, um político moderno, com um programa “fluido” adaptado às circunstâncias do mercado, vale por dizer um dirigente sem programa nem coluna vertebral.

Matteo Renzi é o próximo primeiro ministro de Itália. Para tal demitiu um companheiro do seu partido, o Partido Democrático, depois ter chegado à cabeça da organização com a promessa simples de correr com a velha guarda e de ter chamado à sede o vetusto Silvio Berlusconi, por sinal acabadinho de cair em desgraça, condenado pela justiça, expulso do Senado. Nesse encontro “histórico”, como costuma dizer a comunicação que julga que a História começou há dias, o novato, “ágil e inovador” Renzi e o caduco e ressuscitado Berlusconi combinaram o golpe: fabricar uma lei eleitoral que “acabe com a instabilidade política em Itália” instaurando um sistema bipartidário em que os dois e os respectivos herdeiros ou mandatados partilhem comodamente o poder político, coisa que pertence aos monstros sem rosto da finança mundial. É mais ou menos a fase em que estamos do golpe a que chamam florentino porque Renzi chegou da Câmara de Florença, onde fez florescer a demagogia que o catapultou para os actuais voos. Matteo Renzi, o autoproclamado chefe “da esquerda” em Itália – o Partido Democrático é a ala “de esquerda” do arco político governante, o partido único da finança em formato bicéfalo – acaba de provocar a demissão do governo de Enrico Letta, seu companheiro de partido, e vai tomar-lhe o lugar.

A coligação com Berlusconi dará poderes constituintes à actual legislatura, de modo a formalizar a lei eleitoral que permitirá aos eleitores a escolha simples entre a “esquerda” e a direita do sistema económico neoliberal. Berlusconi declara-se aliviado: assim nunca mais terá de governar aliado “à esquerda”. Pois não: a maioria será sempre, com absoluta certeza ditada por lei, de um ou outro.  Um golpe fino, civilizado.

Quanto à “esquerda” de Renzi não há muito de inovador, desde Blair está espelhada em vários casos como os actuais de Hollande em França e dos sociais democratas na Alemanha. A origem política de Matteo Renzi nada tem a ver com a esquerda, ele chega das áreas da democracia cristã e também essas pouco têm a ver com a original, a doutrina social da Igreja é uma coisa arcaica na política, o Papa Francisco que o diga. Para que conste, o programa do novo primeiro ministro de Itália para tomar conta do seu partido resumiu-se a afastar os poucos restos de comunistas e socialistas que havia desde que os históricos PCI e PSI se diluíram, há 25 anos, nessa bagunça que é o PD à americana, tão nova esquerda como velha direita.

Guiné Equatorial: "Dinheiro de Obiang compra tudo", até CPLP, diz oposição



AFP, traduzido por Susana Salvado em Diário de Notícias

O líder da oposição da Guiné Equatorial no exílio, Severo Moto, declarou-se surpreendido pela aceitação da adesão do país à CPLP, afirmando que "o dinheiro de Obiang compra tudo", inclusive a integração na organização lusófona.

"Depois de ter lido várias declarações críticas ao regime de [Teodoro] Obiang, inclusive de responsáveis portugueses, esperava que o resultado fosse negativo", disse quarta-feira à noite à Lusa em Madrid, referindo-se ao chefe do Estado da Guiné Equatorial.

"Mas na realidade não me estranha que tenha sido assim. É mais uma demonstração de que o dinheiro de Obiang em África e fora de África compra tudo. Até compra a adesão à CPLP", afirmou.

Os comentários de Moto surgem depois de a cimeira extraordinária dos ministros dos Negócios Estrangeiros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) ter recomendado hoje em Maputo a adesão da Guiné Equatorial à organização.

A adesão, como membro de pleno direito, foi aprovada como uma recomendação para a cimeira de chefes de Estado da organização que se realiza em Díli este ano, disse à Lusa o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete.

O ministro acrescentou que "Portugal se sente à vontade com esta decisão", uma vez que, afirmou, a Guiné equatorial seguiu todo o roteiro, incluindo a questão da moratória à pena de morte.

Informado da notícia pela Lusa, Moto afirmou que as suas críticas não se dirigem "ao povo lusófono", reiterando que a população da Guiné Equatorial "acolherá de braços abertos" os países da CPLP.

"Mas daí a forçar, com dinheiro, a adesão, não é adequado. Não se deve conseguir a adesão à base de dinheiro. O Obiang consegue o que quer com dinheiro", disse.

"No caso de Portugal, teve que investir no Banif mas conseguiu comprar o apoio. Continua assim o processo de Obiang procurar uma qualquer legitimação diplomática e prestígio internacional", sublinhou.

No início de fevereiro, o Banif revelou que estabeleceu um memorando de entendimento com a República da Guiné Equatorial visando a colaboração entre as partes no setor bancário, que poderá levar à entrada de uma empresa daquele país africano no capital do banco.

A CPLP ENTRE A AMBIÇÃO E A IRRELEVÂNCIA



José Manuel Pureza – Diário de Notícias, opinião

A candidatura da Guiné Equatorial a membro de pleno direito da CPLP - o país tem o estatuto de observador desde 2006 - desafia os seus Estados membros a assumir uma posição clara sobre o que deve ser esta plataforma no mundo de hoje.

O que motiva uma das mais velhas e torcionárias ditaduras de África a bater à porta da CPLP é claro: procurar a caução internacional que lhe tem sido negada por toda a gente. Nenhum governo quer aparecer na fotografia como parceiro de um regime que faz da corrupção, da tortura, das prisões arbitrárias, da negação das liberdades básicas o seu modo de ser há 35 anos. Ninguém quer ser avalista internacional de um governo que, a isto tudo, junta a capacidade de transformar um dos mais elevados PIB per capita de África num dos mais baixos lugares no índice de desenvolvimento humano, ou seja, um país onde, não obstante ter um rendimento médio per capita idêntico ao de Itália, mais de 70% da população vive com menos de dois dólares por dia.

O regime de Teodoro Obiang precisa de furar o muro de ostracismo a que o sentimento de conveniência da comunidade dos Estados o votou. E a CPLP é o veículo por ele escolhido para essa operação de branqueamento. Ora, face ao cadastro ditatorial de invulgar envergadura e à ausência de qualquer ligação efetiva à língua portuguesa, causaria, no mínimo, estranheza qualquer abertura da organização às pretensões de Obiang. A estranheza, porém, desvanece-se logo que surge a palavra petróleo: a Guiné Equatorial é o terceiro produtor de petróleo e de gás natural da África subsariana e os milhões do ouro negro permitem ensaiar a compra de vontades onde quer que seja. Ou nem isso, porque há os que, não precisando de petróleo nem dos seus proventos, apreciam a condescendência dos seus parceiros para com um regime como o da Guiné Equatorial porque isso os legitima. É essa a tragédia desta situação: perdendo a democracia, todos parecem ganhar.

A mais recente expressão dessa estratégia de compra de vontades é a promessa de injeção de 133,5 milhões de euros no Banif por uma empresa estatal da Guiné Equatorial, permitindo assim ao banco concluir a sua recapitalização, indispensável para passar no exame da União Europeia. Não há nenhuma racionalidade económica em tal investimento nem nenhuma outra razão plausível que não seja o amaciamento das reservas levantadas até agora por Portugal à entrada da Guiné Equatorial na CPLP. Não é certamente um acaso que o discurso do Governo tenha evidenciado, nos últimos dias, sinais de abertura à pretensão de Obiang. A CPLP não é um clube de democratas imaculados, longe disso. Nem a língua oficial comum aos seus Estados membros dá à organização uma singularidade idealista de que andem arredadas estratégias de poder. A questão é outra. A CPLP nunca terá condições para constituir um bloco que compita com outros internacionais fundados no poder militar ou no poder económico. Não é, não pode ser, esse o seu campeonato. O que lhe dará credibilidade será antes o seu contributo específico para as políticas de diplomacia preventiva, de suporte às práticas democráticas ou de cooperação Sul-Sul (sobretudo no plano cultural).

É por isso que a aceitação do regime de Obiang será o pior dos sinais. Porque mostrará uma organização disposta a abdicar da ambição de ter a força da diferença para se tornar um entreposto de negócios legitimadores de poderes políticos autoritários. Com uma agravante: terá muito menos poder que outros entrepostos do mesmo tipo e tornar-se-á, portanto, facilmente descartável. A CPLP tem condições para ser pioneira na implementação de políticas de natureza pós-colonial. Aceitando Obiang descaracteriza-se e abre-se ao caminho da irrelevância.

Portugal – PSD: OS CONGRESSOS DA COBARDIA



Daniel Oliveira – Expresso, opinião

Como se tornou habitual desde que os dois principais partidos instituíram as eleições diretas, não se vai passar nada no congresso do PSD. O único momento em que se pode decidir realmente alguma coisa acontece antes, com as eleição dos líderes. Que passou a fazer-se, de forma ainda mais descarada, através de sindicatos de voto, que o Estado pagará através de favores e nomeações. Já os congressos, onde antes podia haver algum debate e alteração de posições, passaram a ser comícios longo e chatos que a comunicação social só acompanha por hábito.

O Congresso que hoje começa será especialmente sintomático do grau de degradação do debate político interno nos dois principais partidos. Nunca um líder partidário português se afastou de forma tão radical da matriz ideológica original do seu partido. Nunca houve tantos autarcas a desobedecer às ordens centrais. Poucas vezes tantos dirigentes históricos desafiaram de forma tão evidente o seu presidente e o criticaram com tanta violência e acinte. Nunca foi tão difícil ouvir uma voz credível, dentro do PSD, em defesa de um governo por si liderado. E, no entanto, Pedro Passos Coelho foi reeleito sem oposição e com 88% dos votos.

Hoje e neste fim de semana talvez se venham a ouvir algumas vozes isoladas, de militantes mais ou menos anónimos, a fazerem algumas críticas. Mas nem uma figura de peso aparecerá no Coliseu dos Recreios para criticar o líder. Nem uma surgirá em defesa das posições do PSD tradicional. Nem uma repetirá ali as críticas que faz na televisão, nas rádios e nos jornais. Não estarão lá Manuela Ferreira Leite ou Pacheco Pereira.

Para quem, como eu, tem uma vida de militância partidária e participou em congressos, fosse eleito por listas maioritárias ou de oposição, com o sentido de dever repetir em frente aos militantes o que diz publicamente, esta cultura de cobardia é muitíssimo perturbante. E uma forma muitíssimo mais grave de desrespeito pelo colectivo partidário do que concorrer em listas independentes contra o seu próprio partido.

Nos PSD, como no PS, cada um espera pelo seu momento para governar o partido sem oposição e considera desprestigiante ir a um congresso para perder. Todos são "senadores" e todos são demasiado importantes para subirem a um palanque e não sairem de lá ovacionados. É uma cultura que molda um tipo de partido que forma um tipo de político que ajuda a construir um tipo de País. Um país que não compreende o papel fundamental da oposição (sem ser para abrilhantar pactos de regime) e do confronto entre alternativas. Mas, acima de tudo, um país que respeita mais o cálculo do sonso do que o risco do corajoso.

Portugal: Bruxelas quer salários mais baixos, FMI mais 3 mil milhões de cortes




Portugal - ACP-PI - Passos Coelho, Paulo Portas e Pires de Lima só podem estar muito tristes com as instituições da troika, pois pensavam que ninguém ia fazer mais declarações sobre austeridade adicional nos próximos meses.

Mas há más notícias para a propaganda do “tudo está bué fixe” do Governo, a Comissão Europeia de Durão Barroso exige que os salários em Portugal desçam ainda mais 2% a 5% e o FMI vem dizer que isto só lá vai com mais cortes estruturais de 3 mil milhões de euros no pós-troika.

Ambas as instituições e mesmo a ministra das Finanças dizem que a austeridade se irá manter durante vários anos porque o crescimento não é sustentável e o endividamento externo está demasiado alto. Ou seja, para pagar a dívida, como na opinião do FMI e CE não é possível crescer sustentadamente, é preciso retirar mais verbas dos funcionários públicos, dos pensionistas, da escola pública e do serviço nacional de saúde. Traduzindo: despedir – como já afiançou Maria Luís Albuquerque.

Pelo caminho o FMI arrasa o "milagre económico" de Pires de Lima, dizendo que as exportações são insustentáveis. Paulo Portas veio ontem dizer que estavam no valor mais alto de sempre, 40%; mas o Fundo informa que o valor tem sobretudo que ver com a exportação de combustíveis refinados em Portugal e não com um aumento dos chamados bens transaccionáveis.

A propaganda vai toda por água abaixo e o Governo fica fora de pé insistindo com a austeridade num momento em que o Parlamento Europeu já aprovou um relatório que afirma que a troika destruiu a economia na Grécia, Portugal, Irlanda e Chipre e que têm de existir medidas para reverter os cortes sociais aplicados.

Diário Liberdade

Portugal: ESTA GENTE É DE CONFIANÇA?



António Galamba – Jornal i, opinião

Já Séneca afirmava que "os factos devem provar a bondade das palavras". E os factos desmentem quase toda a propaganda do governo

Há quase três anos, como maior partido da oposição, o PS reafirmou o compromisso com as metas do Memorando, mas com outro caminho, que conjugasse o rigor nas contas públicas com uma estratégia e com políticas para o emprego e o crescimento económico. Dizia António José Seguro que Portugal precisava de mais tempo e de juros mais baixos. Invariavelmente, Pedro Passos Coelho e os repetidores da maioria, disseram não a tudo e prescindiram do contributo do PS. Estava tudo no bom caminho.

Há quase três anos, Pedro Passos Coelho assumia que o Memorando correspondia ao seu programa político e era preciso "surpreender e ir mais além [das metas] do acordo". Queria e foi. Pode até ter enriquecido o léxico dos portugueses com palavras como " modelar", "densificar", "mitigar" ou "calibrar", mas esse enriquecimento e o dos ricos mais ricos foram os únicos registados. Tem razão quem afirma que houve uma redistribuição sem precedentes. Sim, houve. Mas foi uma redistribuição de desemprego, de pobreza e de emigração.

Durante dois anos, a maioria exercitou os preconceitos contra o Estado, deixou os mercados funcionarem a seu bel-prazer, eliminou direitos e fez implodir avanços civilizacionais. Tudo em nome do cumprimento das metas. E sempre de olhos postos no passado e com profundo desprezo pelos contributos do PS. Foram centenas de propostas chumbadas no parlamento e demasiadas opções políticas assumidas, sem qualquer consulta ao PS, em matérias estruturais, nas privatizações ou nas sucessivas revisões do Memorando. Sempre de tesoura em riste.

Durante dois anos, a tónica foi: sigam--nos que nós fazemos, só têm de avalizar! Subitamente no Verão passado, na conversa, tudo mudou. Portas demitiu-se de forma irrevogável e Gaspar demitiu-se de forma efectiva com estrondo, invocando " o incumprimento dos limites originais do programa para o défice e a dívida, em 2012 e 2013".

Já Séneca afirmava que "os factos devem provar a bondade das palavras". E os factos desmentem quase toda a narrativa de propaganda do governo em torno do milagre económico e o exasperante discurso de assédio ao PS.

O governo PSD/CDS falhou no défice, na dívida pública e no desemprego, apesar de ter ido muito além nos cortes e nos sacrifícios. Os ténues sinais positivos nas taxas de juros, nas exportações e na criação de emprego não são sólidos nem sustentáveis. Ainda ontem o FMI sublinhava que o ajustamento externo da economia portuguesa está a ser feito à custa da contracção das importações e do crescimento das exportações de combustíveis. Com tanta incompetência, impreparação e falta de resultados, será difícil que os credores não se questionem sobre se o governo é de confiança. Só isso justifica a sucessão de exigências de mais cortes e garantias.

Mas os factos desmentem também a bondade dos apelos do primeiro-ministro e dos acólitos aos consensos com o PS, que mais parecem desvios comportamentais em função do passado e do presente.

Alguém acredita que uma maioria que foi incompetente a executar a sua estratégia para a consolidação das contas públicas pode ser competente a executar políticas de que discordou? Alguém acredita que uma maioria que insistiu na extinção de freguesias, na extinção de tribunais, de repartições de Finanças ou do Programa Novas Oportunidades, sempre com a oposição do PS e sem criar alternativas para pessoas e territórios possa mudar?

Alguém acredita que uma maioria resignada com as consequências dos cortes na educação, na saúde e na protecção social e conformada com a Europa que temos possa mudar de atitude e política?

Ninguém acredita, muito menos nós. Esta gente não é de confiança.

Político (PS)

Portugal: PENSAVAM QUE SE SAFAVAM, MAS O FMI NÃO DEIXA



Henrique Monteiro – Expresso, opinião

Bem tenho eu esfalfado os dedos a pedir uma saída cautelar, tutelada, ou o que seja, que não deixe à solta o pessoal cá do sítio. Ora bem, o FMI percebeu que a gente da nossa terra já andava em roda-viva a falar de baixar impostos e aumentar salários e deu uma cacetada valente nas nossas cabeças, tipo carolo que os professores primários pré-modernos davam nos miúdos mal comportados. E avisou o ponderado FMI que despesismo e descidas de impostos eleitoralistas são interditos. Portas engoliu em seco.

Depois veio a Europa dizer que os salários portugueses para estarem bons, mas mesmo bons, deviam baixar ainda cerca de 5%. Passos e Seguro devem ter engolido em seco.

No meio de tudo isto, acaba-se a festa antes mesmo de começar. Por mim está bem, além de não confiar nem um bocadinho nestes milagres, além de saber que ainda temos crise para muitos anos - em Portugal e na Europa toda - sustento que a mudança que estamos a viver por todo o mundo obrigará a equilíbrios precários para os quais é necessária muita prudência.

Este Governo pensava que se safava em 2015. Certas pessoas na Oposição pensavam que em 2015 já podiam estar safos. Nem uns nem outros acertaram. Talvez, deste modo, em vez das promessas de 'bacalhau a pataco'  (como se dizia em finais do séc. XIX) possamos ter debates sérios sobre o nosso papel na União Europeia e no mundo; sobre o papel da Europa no mundo globalizado e sobre as reformas que precisamos, enquanto país, de fazer para nos adaptar a estas novas realidades.

Portugal: AS AMBIGUIDADES DESTA 10ª AVALIAÇÃO




As 94 páginas do relatório da 10ª avaliação da troika constituem mais um exercício de mistificação. Após o fracasso das receitas impostas à Grécia, as troikas tinham necessidade de apresentar um success case. Assim, apesar do fracasso rotundo do programa de "ajustamento" aplicado a Portugal que agravou todos os problemas (excepto os dos credores do país), eles esforçam-se por dizer que aqui houve algum êxito. Tentam salvar a face. Contudo, não podem deixar de reconhecer (de modo mutio parcial) aspectos gravosos dos tratos a que tem sido submetido o povo português. Quem quiser dedicar-se ao estudo de ambiguidades, tem neste relatório uma leitura instrutiva.

Resistir.info

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