quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A BOTA DA BATOTICE ELEITORAL CNE/MPLA

 


Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
 
José Eduardo dos Santos tinha mesmo anulado a sua deslocação eleitoral ao Huambo porque, na verdade, nem tudo o que tinha previsto inaugurar, como foi o caso dos centros culturais no Huambo e no Bailundo, estava pronto.
 
À última hora, por força do marketing brasileiro que dirige a campanha e pela garantia de que o MPLA levaria para o Huambo, a tempo de aplaudir o presidente, “contratados” do Bié, Kuanza-Sul e Benguela, Eduardo dos Santos aceitou ir, apostando tudo na inauguração da barragem do Gove na Caála.
 
E enquanto o MPLA começa a requisitar doses industriais de aspirinas perante as dores de cabeça que as más perspectivas eleitorais criam, como é o caso do Huambo, a sua sucursal Comissão Nacional Eleitoral (CNE) mostra que não sabe como descalçar a bota da batotice.
 
Pelos vistos, estão inscritos 9.757.671 eleitores. Quem garante a veracidade deste número? Ninguém. São esses, diz o governo do MPLA. Se o governo diz que são esses, a CNE aceita e assina por baixo.
 
De acordo com uma auditoria de Delloitte, a identificação de alguns eleitores – apenas 6.500.000, seis milhões e meio - não pode ser autenticada.
 
Diz a CNE/MPLA que existem 1.704 eleitores na povoação da Txamba, comuna do Luachimo, município do Chitato. Será? É que nessa localidade vivem catangueses que, em princípio, são estrangeiros e como tal não são eleitores.
 
Somam-se, contudo, os milagres de multiplicação de eleitores. A CNE garante que na povoação de Bumba Tembo Lóvua, no Município do Chitato, na Lunda Norte, existem 992 eleitores. Fontes locais, que até não precisam de se descalçar para contar até 12, garantem que só lá vivem 200 eleitores. No mesmo município, Chilondo tem 323 eleitores. Mas a CNE diz que são 841.
 
Para além de haver muitos eleitores correctamente inscritos que não aparecem registados, a CNE/MPLA conseguiu outros não raros fenómenos típicos do regime angolano. Povoações como Sachimica, Alegria, Ngongo, Nguji, Muleleno, no Moxico, foram pura e simplesmente banidas e deixaram de existir.
 
No Moxico mais de 70% dos eleitores, em todos os municípios fora da capital, terão de votar em locais fora da sua residência, em alguns casos, em outros municípios, e até fora da sua província!
 
Os eleitores da Chivunda, no Liangongo, Município do Léua, por exemplo, terão de votar na Caianda, município do Alto Zambeze, a mais de 300 quilómetros de distância. Eleitores de Macondo, Alto Zambeze, terão de votar no Bailundo, província do Huambo, a mais de 500 quilómetros de distância. De facto a CNE/MPLA não brinca em serviço.
 
Embora se esteja na recta final, há cerca de um milhão e meio de cartões eleitorais por entregar. O que irá acontecer? Os seus legítimos titulares não poderão votar, mas não há a garantia de que eventuais ilegítimos titulares não o façam.
 
Embora se saiba que, tal como em 2008, milhares de eleitores que já morreram mas que constam dos cadernos eleitorais serão chamados a votar - desde que o façam no MPLA, há também muito milhares que estando vivos e inscritos foram banidos. São, com certeza, cidadãos suspeitos e originários de áreas problemáticas (as mais afectas à UNITA).
 
Apenas por curiosidade registe-se que todo o Ficheiro Informático Central do Registo Eleitoral (FICRE) está nas mãos, certamente limpas, dos igualmente impolutos cidadãos que geram a empresa privada contratada para esse efeito, a SINFIC. O facto de esta empresa estar ligada ao MPLA é apenas mera coincidência.
 
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
 
Título anterior do autor, compilado em Página Global: NO HUAMBO CHEIRA A DERROTA DO MPLA
 

Angola: CREDIBILIDADE DAS ELEIÇÕES ANGOLANAS ESTÁ CADA VEZ MAIS EM BAIXA

 


Sindicato dos Jornalistas preocupado com comportamento dos media
 
22 de Agosto de 2012, 18:10
 
Luanda, 22 ago (Lusa) - O Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) considera que os órgãos públicos e privados "violam de forma grosseira e intolerante as leis que regulam o exercício do jornalismo em geral e em tempo de eleições".
 
A conclusão consta de um relatório sobre a Monitorização da Media Angolana em Tempo de Eleições, apresentado hoje em Luanda, pela secretária-geral do SJA, Luísa Rogério.
 
Angola realiza eleições gerais no dia 31 de agosto, estando as nove formações políticas concorrentes em campanha eleitoral, desde o dia 31 de julho.
 
No documento, referente às duas primeiras semanas de agosto, entre os jornais analisados, o semanário privado Agora "é o único que manteve o equilíbrio" até à conclusão do relatório.
 
Segundo o relatório, os outros órgãos "beneficiam de forma explícita o Movimento Popular de Libertação de Angola", partido no poder, com largos destaques nos órgãos públicos e privados, e um semanário privilegiou a Convergência Ampla de Salvação de Angola -- Coligação Eleitoral, a nova formação criada pelo dissidente da União Nacional para a Independência Total de Angola Abel Chivukuvuku.
 
A título de exemplo, o relatório aponta que o estatal Jornal de Angola publicou no período em referência 26 notícias sobre o MPLA e 10 sobre a UNITA, o maior partido angolano da oposição.
 
"Não é difícil perceber a razão que está por detrás desta cobertura, mas este aspeto será alvo de reflexão em próximos relatórios, com base nos resultados das conferências a serem promovidas pelo SJA no âmbito deste projeto de monitorização patrocinado pela Fundação Open Society"", lê-se no documento.
 
O relatório sublinha igualmente que o semanário Folha 8, apesar de quantitativamente dar atenção ao MPLA, no plano qualitativo oferece "tratamento privilegiado" à coligação CASA-CE.
 
"A posição surpreendente em que o MPLA está decorre de uma enorme quantidade de factos negativos a si imputados e às figuras do partido", acrescenta o documento sobre o tratamento dado por este jornal ao partido no poder.
 
O relatório hoje apresentado analisou todos os órgãos de comunicação social angolanos.
 
NME
 
Embaixada EUA exorta CNE a credenciar "imediatamente" observadores
 
22 de Agosto de 2012, 18:27
 
Luanda, 22 ago (Lusa) - A Embaixada dos Estados Unidas em Luanda exortaram hoje, em comunicado distribuído à imprensa, a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) para que "credencie imediatamente" os observadores eleitorais, designadamente os das organizações da sociedade civil angolana.
 
Em causa estão os atrasos da CNE em credenciar não só aqueles cidadãos angolanos, como também "outros observadores internacionais", como elementos do corpo diplomático acreditado na capital angolana.
 
Nesse sentido, o comunicado acrescenta que "um grupo de embaixadores solicitou ao Presidente da CNE, Silva Neto, uma reunião para tratar deste assunto".
 
José Eduardo dos Santos assume compromisso pessoal de apoiar setor privado
 
22 de Agosto de 2012, 19:23
 
Huambo, Angola, 22 ago (Lusa) - O líder do MPLA, José Eduardo dos Santos, assumiu hoje no Huambo, centro de Angola, num comício integrado na campanha eleitoral para as eleições gerais de 31 deste mês, o seu compromisso no apoio ao setor privado angolano.
 
"Eu assumo, em nome do MPLA, o compromisso de reforçar o apoio de todo o tipo aos empresários angolanos, para que eles tenham empresas fortes que ocupem um grande espaço no nosso mercado. Não são só as grandes empresas estrangeiras, como a Teixeira Duarte, a Odebrecht, a Total-Elf, a Chevron, etc., que devem prosperar e levar grande parte do dinheiro que ganham para os seus países", asseverou citado pela agência Angop.
 
José Eduardo dos Santos, Presidente de Angola desde 1979, garantiu na ocasião que o Estado "vai continuar a retirar-se da produção de bens e serviços para que esta tarefa seja levada a cabo pelas pequenas, médias e grandes empresas privadas" angolanas.
 
"O dinheiro que elas ganham fica no nosso mercado e, além disso, devemos incentivá-las a fazer mais investimentos, a criar mais empregos e a pagar bem aos seus trabalhadores", destacou.
 
José Eduardo dos Santos defendeu ainda que os angolanos que mantêm poupanças no estrangeiro, onde efetuam investimentos, o depositem na banca angolana, realizando os seus investimentos no país.
 
"Nós não fazemos uma política contra os angolanos ricos. Pelo contrário. Queremos que eles contribuam para o desenvolvimento nacional", frisou, segundo a Angop.
 
Relativamente ao próximo mandato, José Eduardo dos Santos garantiu que o MPLA e o seu governo vão intensificar uma "política firme de luta contra a fome e a pobreza", porque, explicou, "a meta é a construção de uma sociedade de bem-estar social, sem pobreza".
 
O líder do MPLA disse ainda que vão ser necessários cerca de 14 mil milhões de euros para executar o Programa de Investimentos Públicos no setor elétrico, designadamente na produção e distribuição de eletricidade.
 
Aquela verba sairá do orçamento do Estado e de empréstimos que o Estado vai contrair.
 
"Eu não tenho receio de assumir esse compromisso, porque estou rodeado de quadros capazes de garantir o cumprimento desse plano", assegurou.
 
Antes do comício no Huambo, José Eduardo dos Santos inaugurou na Caála, a barragem do Gove, empreendimento com capacidade de produção de 60 megawatts.
 
A obra, orçada em cerca de 225 milhões de euros, foi construída pela empresa brasileira Odebrecht.
 
O início da construção foi em 1969, mas em 1975, com a guerra civil angolana, as obras foram interrompidas, tendo sido retomadas em 1983.
 
Em 1986 foram novamente interrompidos os trabalhos, com novo recrudescer da guerra civil na região.
 
A barragem chegou a ser destruída parcialmente em 1990, depois de ter sido dinamitada, reiniciando-se finalmente as obras em 2001.
 
A província do Huambo foi a quinta a ser visitada por José Eduardo dos Santos no âmbito da campanha eleitoral.
 
A próxima deslocação está agendada para sexta-feira à província da Huíla, centro sul do país.
 
Angola realiza eleições gerais a 31 de agosto, que vão definir a composição do parlamento e os nomes do Presidente e vice-presidente, nomeados a partir do número um e número dois da lista do partido mais votado.
 
EL.
 
*O título nos Compactos de Notícias são de autoria PG
 

NAVIO DE ESPIONAGEM ALEMÃO NA COSTA SÍRIA PROVOCA DISCUSSÃO

 

 
A Marinha alemã cruza águas próximas a um país em guerra. O governo alemão fala em manobra de rotina, a oposição considera a ação um envolvimento numa guerra. O que realmente ocorre, o público provavelmente nunca saberá.
 
O jornal alemão Bild am Sonntag publicou uma reportagem neste domingo (19/08) sobre a suposta utilização do navio Oker para uma missão de espionagem no Mediterrâneo. O navio de apoio da frota alemã estaria equipado com instalações de espionagem avançada do Serviço Federal de Informações (BND, na sigla em alemão), com os quais seria possível coletar notícias no interior da Síria. Estes dados, por sua vez, seriam transmitidos aos serviços parceiros dos americanos e britânicos, chegando, através destes, aos rebeldes sírios. Caso a informação do jornal esteja correta, o fato teria carga realmente explosiva. Pois, oficialmente, a Alemanha não está envolvida de forma alguma na guerra civil síria.
 
Diferença entre reconhecimento e espionagem

Seja como for, a palavra "navio espião" já está em todas as bocas. E a suspeita é compartilhada pelos oposicionistas dos partidos A Esquerda e Verdes. Na interpretação do ministério alemão da Defesa, o Oker e outros dois barcos seriam "unidades de reconhecimento, comunicação e alerta de longo alcance". O porta-voz do ministério, Stefan Paris, descreveu as manobras diante da costa síria como uma missão desarmada de reconhecimento, "como fazemos regularmente".
 
O barco, segundo o órgão governamental, vai operar até o final do ano. Sua missão condiz com suas habilidades, conforme Paris: "recolher informações". Ele, entretanto, não pode fornecer mais detalhes no que se refere a objetivos e resultados da operação. Também a Chancelaria Federal, responsável pelo serviço secreto BND, só emitiu comentários genéricos. O porta-voz de Angela Merkel, Steffen Seibert, afirmou que, "como sempre", não pode dar informações sobre operações do serviço de inteligência.
 
Controle parlamentar
 
Já o Grêmio de Controle Parlamentar (PKG, na sigla em alemão) do Bundestag seria uma exceção. "Caso haja perguntas dos parlamentares, o governo naturalmente fornecerá as informações devidas", garantiu Seibert. Esta observação é interessante, já que o governo alemão é obrigado por lei a informar o PKG. O comitê, que se encontra secretamente, deve ser informado "amplamente sobre as atividades gerais" do BND e também sobre o Serviço de Contrainteligência Militar (MAD, na sigla em alemão) e o serviço interno de espionagem, o Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfV, na sigla em alemão).
 
O deputado dos Verdes Hans-Christian Ströbele integra o PKG e se sentiu diversas vezes mal ou pouco informado pelo governo. Por isso, ele cogita convocar uma sessão especial do PKG por causa da operação do navio alemão no Mediterrâneo. Mas mesmo que isso aconteça, as informações fornecidas na reunião permanecerão secretas, já que os membros do PKG são obrigados a guardar sigilo.
 
Parceiros da Otan são informados
 
Embora as opiniões dos deputados geralmente sejam diferentes. Hans-Peter Uhl, assessor especializado em serviço secreto da bancada democrata-cristã, não vê qualquer "obrigação de informar" por parte do governo alemão no caso da missão do Oker na costa da Síria. Em entrevista à edição online do jornal Frankfurter Rundschau, Uhl opinou que "grampear" o regime de Assad faz parte das "atividades normais de inteligência". Mas se o BND vier a saber que o regime de Assad utiliza armas químicas ou que estas podem cair nas mãos dos rebeldes, a informação teria uma grande importância política, "e o Parlamento alemão teria de ser informado sobre isso", ressaltou o político.
 
Nesta segunda-feira (20/08), o presidente dos EUA, Barack Obama, ameaçou a Síria com uma ação militar, caso Assad utilize armas químicas ou biológicas. Ele alertou que, mesmo nos preparativos para uma tal utilização, a "linha vermelha" já teria sido ultrapassada. Os indícios decisivos podem, teoricamente, vir do BND. Caso o serviço secreto alemão obtenha tais informações, as repassaria aos EUA automaticamente. O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, também reconheceu na segunda-feira que considera "normal que informações sejam compartilhadas com os parceiros da Otan".

Lembranças da guerra no Iraque
 
Um caso similar, ocorrido durante a guerra do Iraque e divulgado em 2003, provocou grande discussão. Embora a Alemanha do então chanceler Gerhard Schröder não tenha se unido à aliança liderada pelos EUA contra o regime de Saddam Hussein, agentes do BND estavam em ação durante o bombardeio de Bagdá. Eles teriam fornecido aos Estados Unidos informações valiosas sobre os movimentos de tropas iraquianas. Críticos acusaram o governo de então de ter participado da guerra, contrariando sua retórica oficial e sendo responsável pela morte de civis.
 
Autor: Marcel Fürstenau (md) - Revisão: Francis França
 

UMA FORMA PARTICULAR DE SADISMO

 


Ramonet: insistência dos dirigentes europeus no sofrimento social inspira-se em Schumpeter — mas assemelha-se curiosamente às ideias do Marquês de Sade
 
Ignacio Ramonet* - Tradução: Hugo Albuquerque – Outras Palavras
 
Sadismo? Sim, sadismo. Como chamar de outra forma a complacência com aquilo que humilha as pessoas e as faz sofrer? Durante estes anos de crise, temos assistido — na Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e outros países da União Europeia (UE) — à impediosa aplicação do ritual de punição “austeritária” exigido pela Alemanha, o que tem provocado um crescimento exponencial dos flagelos sociais (desemprego, pobreza, mendicância, suicídios).
 
Apesar disso, Angela Merkel e seus aliados continuam a afirmar que sofrer é bom e que, ao invés de suplício, o ato deveria ser considerado um instante de prazer… Segundo eles, cada nova expiação nos purificará, nos regenerará e nos aproximará do fim da tormenta. Essa filosofia da dor não se inspira no Marquês de Sade, mas sim nas teorias de Joseph Schumpeter, um dos pais do neoliberalismo, segundo o qual todo sofrimento social responde a um necessário objetivo econômico; e será errado, em consequência, amenizar o suplício, mesmo que ligeiramente.
 
Eis que Angela Merkel entra em cena como Wanda, a dominadora, encorajada por um coro de fanáticas instituições financeiras (Bundesbank, Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional…) e por todos os eurocratas sectários habituais (José Luís Barroso, Von Rompuy, Olli Rehn, Joaquin Almunia…). Todos apostam na existência de um masoquismo popular, que empurraria os cidadãos não apenas à passividade, mas a clamar por mais punições e mortificações — ad maiorem Europa gloriam [Para maior glória da Europa, trocadilho com ad maiorem Dei gloriam, lema dos jesuítas (Nota da Tradução]. Sonham realmente em administrar os povos por meio daquilo que a polícia chama de “golpe do boa-noite cinderela” — isto é, fazer uso de substâncias capazes de eliminar total ou parcialmente a consciência das vítimas, deixá-las sem forças para, enfim, torná-las marionetes nas mãos de seus agressores. Mas devem tomar cuidado, porque as massas começam a rugir.
 
Na Espanha, por exemplo, onde o governo conservador aplica políticas selvagens de austeridade ao limite do sadismo [1], as manifestações de descontentamento social se multiplicam. Neste momento, o país se encontra (com a Grécia) no coração da crise financeira mundial. O presidente do governo, Mariano Rajoy, e sua equipe econômica têm dado, ao longo dos últimos meses, a impressão de avançar sem bússula. Dirigem a crise bancária com uma evidente falta de jeito, notadamente por deixar ocorrer a falência do Bankia e por praticar o negacionismo mais limítrofe, a propósito do plano de resgate europeu dos bancos espanhóis, que o ministro da economia local, Luis de Guindos, apresenta como a concessão de uma simples linha de crédito, que não afeta em nada o déficit público [2].
 
De fato houve, depois, a Cúpula Europeia de 28 e 29 de Junho — uma pressão conjugada da França, Itália e Espanha a fim de aceitar que o novo Mecanismo Europeu de Estabilidade (ESM, na sigla em inglês) possa emprestar diretamente aos bancos europeus em dificuldade (notadamente os espanhóis), sem que essa ajuda onere a dívida soberana dos Estados. Em contrapartida, contudo, os Estados deverão aplicar políticas severas de ajuste e austeridade exigidos pela UE, e ceder uma parte de sua soberania em matéria orçamentária e fiscal.
 
Berlim quer se beneficiar do choque causado pela crise, e de sua posição dominante, para alcançar um velho objetivo: integração política da Europa de acordo com as condições alemãs. ”Nosso projeto hoje — declarou Merkel num discurso no parlamento alemão, o Bundstag [3] — é atingir o que não foi feito (quando o euro foi criado) e acabar com o ciclo vicioso da dívida infinita e da não-aplicação das regras. Eu sei que isso é duro, doloroso. É uma tarefa hercúlea, porém indispensável”.
 
Se o chamado “salto federal” ocorrer, e se a Europa avançar rumo a uma maior união política, isso significará, para cada Estado-membro da UE, renunciar a novos elementos de sua soberania nacional. Uma instância central poderia intervir diretamente para ajustar o orçamento público e fixar os tributos de cada Estado, em nome dos compromissos europeus. Quais países estão dispostos a abandonar sua soberania nacional? Porque, se ceder certos aspectos da soberania é inevitável, em um processo de integração como a União Europeia, é necessário dizer também que não se deve confundir federalismo com neocolonialismo… [4]
 
Nos países da UE atualmente sujeitos aos planos de resgates, essas perdas de soberania já são uma realidade. Sobre a Espanha, o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, também disse que a “troika” (BCE, Comissão Europeia e FMI) irá controlar a reestruturação do sistema bancário[5]. Será que isso mudará depois da decisão adotada na Cúpula Europeia de 28 e 29 de Junho últimos?
 
Isso é provável porque, como têm apontado os economistas Niall Ferguson e Nouriel Roubini: “A estratégia de recapitalizar os bancos, forçando os Estados a tomar emprestado dos mercados nacionais de bônus — ou do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF) — foi desastrosa para a Irlanda e Grécia, pois isso causou uma explosão da dívida pública e tornou os Estados ainda mais insolventes. E, ao mesmo tempo, os bancos tornaram-se eles mesmos um risco incontrolável, na medida em que passaram a deter uma parcela ainda maior da dívida pública”[6].
 
Se isso não funcionou, por que persistir com essas políticas “de austeridade” por tantos anos? A inquietação das sociedades tem conseguido retardar o sadismo econômico encarnado pela Alemanha. Mas por quanto tempo?

* Ignacio Ramonet é presidente da Associação Memória das Lutas (Medelu) e editor do Le Monde Diplomatique, edição espanhola.
 

OS EUROPEUS SÃO DEMASIADO DIFERENTES PARA SE ENTENDEREM

 


Dagens Nyheter,  Estocolmo – Presseurop – imagem Beppe Giacobbe
 
Mais que as diferenças entre os desempenhos económicos dos países da UE, são os fossos culturais entre europeus que representam o principal obstáculo à criação de uma comunidade verdadeiramente homogénea. Não espanta, pois, que seja tão difícil construí-la.
 
 
Muitos tentaram unificar a Europa. Todos deram com a cabeça na parede: Átila, Carlos Magno, Napoleão, Hitler. A mais recente tentativa é a da União Europeia. Que não avança a golpes de espada, já que a Europa, depois de Hitler, se tornou um continente pacifista, adotando antes meios inofensivos, como a boa vontade, instituições comuns, leis e regulamentos. O euro foi a mais recente – e provavelmente a mais ousada – das iniciativas em prol de uma Europa unificada.
 
A origem do moderno projeto europeu é política, ainda que o foco tenha sido colocado, desde o início, sobre a economia. A comunidade do carvão e do aço visava retirar as indústrias necessárias à guerra do quadro dos Estados-nação, para evitar novos conflitos. As economias nacionais deviam reunir-se num mercado único sem fronteiras e convergir gradualmente umas para as outras.
 
O projeto não se baseava simplesmente no primado da economia, mas também na ideia de que a racionalidade económica deveria permitir a criação de um entendimento comum noutras áreas, a fim de criar um conjunto aparentado com os Estados Unidos da Europa.
 
A região mais complexa do mundo
 
A economia desempenhou, indubitavelmente, um papel decisivo para afastar a guerra da Europa e, nesse sentido, a cooperação europeia tem sido um enorme êxito, desde 1945. Mas a cooperação económica não basta para o que precisamos de construir hoje. A crise do euro veio ensinar-nos que essa cooperação tem algumas limitações, que são sobretudo históricas e culturais. Porque a Europa é, sem dúvida, a região mais complexa do mundo.
 
Num espaço relativamente pequeno, mais de 300 milhões de pessoas tentam formar uma união, quando não é necessário afastar-se muito para deixar de entender o que diz o vizinho, para encontrar pessoas que comem e bebem coisas desconhecidas, que cantam outras canções, que celebram outros heróis, que têm outra relação com o tempo, outros sonhos e outros fantasmas.
 
Ora, estas diferenças subjacentes raramente são invocadas. São mascaradas por um discurso em que todos os europeus aparecem naturalmente unidos perante o resto do mundo, quando um sueco terá provavelmente mais em comum com um canadiano ou um neozelandês do que com um ucraniano ou um grego. É provável que sejam principalmente as nossas diferenças culturais – e não políticas ou económicas – a fazer com que a história europeia esteja repleta de hostilidade e de violência, a começar pelas duas mais terríveis guerras que a humanidade já conheceu, as quais não foram, afinal, mais do que guerras civis europeias.
 
No entanto, tudo isso parece ter sido esquecido ou ignorado. Para não dizer desconhecido. De tal modo que o discurso europeu que nos impingem quotidianamente – a bandeira, Beethoven, a Eurovisão, etc. – pouco tem a ver com a realidade europeia. É um mero produto de propaganda, de um projeto que não quer ouvir falar de diferenças culturais ou mentais, que são, contudo, nitidamente mais profundas do que as diferenças materiais ou financeiras.
 
A Europa em que não queremos acreditar
 
Na realidade, foi preciso esperar pela crise europeia para abrirmos os olhos para o fosso que separa a retórica da realidade. Para nosso espanto, a crise revelou-nos pessoas que nunca pagaram impostos, que consideravam que os outros tinham obrigação de pagar as dívidas por elas e que acusavam de despotismo os que lhe estendiam a mão. Não sabíamos da existência de tais europeus e ficamos incrédulos. No entanto, essa é a realidade e vem de há muito.
 
Quem, para além dos especialistas, sabia há um ano o que é o clientelismo? Uma amiga minha é ministra desde o início do ano. Não é um Ministério de primeiro plano, mas quando lhe perguntei quantos funcionários permanentes estão na sua folha de pagamentos, respondeu quinhentos. Quinhentos? Parece muito para um país como a Croácia. De quantos colaboradores precisaria para desenvolver a política que pretende levar a cabo?
 
A resposta cai como um raio: de trinta. "E estás a pensar demitir os restantes 470?" A ministra lança um olhar simultaneamente compreensivo e corrosivo ao simplório de a Norte dos Alpes, que sou eu (apesar de não ser loiro, sequer). Não. Porque não tenciona pôr a sua vida em risco. Especialmente porque tem um filho que vai para a escola a pé todos os dias. E um acidente pode acontecer a qualquer momento. Mesmo depois de a minha amiga deixar funções, cerca de 500 funcionários vão continuar todos os dias a ir para escritórios onde não os espera trabalho nenhum. Só os salários que recebem existem no mundo real.
 
É assim a nossa Europa. E repare-se que o Norte não é menos estranho que o Sul, e o Leste não o é menos que o Ocidente, e vice-versa. É tudo uma questão de ponto de vista. A Europa não é nem mais nem menos do que uma colmeia extremamente frágil, composta por especificidades culturais, históricas e mentais. Nenhum europeu se parece verdadeiramente com os outros. E, no entanto, preferimos encarar essa Europa não como uma colmeia, mas como um frasco de mel, pronto a consumir.
 

ESPECIALISTAS CRITICAM COBERTURA DA CAMPANHA ELEITORAL ANGOLANA



Deutsche Welle

Desequilíbrio e impunidade. Estas são apenas duas das palavras usadas por vários especialistas para descrever a cobertura jornalística da campanha para as eleições gerais de 31 de Agosto em Angola.

A pouco mais de uma semana do dia em que se decide o elenco do parlamento e os nomes do Presidente e Vice-Presidente da República de Angola, o Sindicato dos Jornalistas angolanos tece duras críticas à atuação da comunicação social durante a campanha.

Sem querer avançar, para já, os resultados do relatório de monitorização dos media angolanos, elaborado pela estrutura, Luísa Rogério, secretária-geral do sindicato, fala numa cobertura desequilibrada e preocupante da campanha eleitoral: "Mesmo sem estarmos diante de resultados definitivos, mesmo sem podermos falar de números, neste momento, eu diria que há alguns desequilíbrios notórios".

Segundo a responsável, o sindicato está preocupado com o comportamento dos meios de comunicação social: "É verdade que eles são sustentados por jornalistas, mas acreditamos que isto tem a ver com política e, mais do que isso, com práticas preocupantes de meios de comunicação social que dão tratamento privilegiado a alguns dos protagonistas da política".

Actuação policial é obstáculo ao jornalismo, diz RSF

Também a organização Repórteres sem Fronteiras está apreensiva quanto à cobertura da campanha para as eleições gerais angolanas. Ambroise Pierre, responsável pelo departamento de África da RSF, afirma que "em Angola, informar corretamente as pessoas tem sido muito difícil para os jornalistas".

Pierre justifica: "Há já algum tempo que a polícia está a dificultar muito o trabalho dos media. E não tenho a certeza se está a cumprir ordens ou se lhe é pedido para o fazer, mas há uma cultura de violência e impunidade para com os jornalistas, que representa um grande problema para Angola".

Media angolanos não são imparciais

Uma opinião partilhada pela Associação angolana Justiça, Paz e Democracia que, na voz de Godinho Cristóvão, denuncia a parcialidade dos meios de comunicação do país, em especial, dos órgãos estatais: “De certa forma, há uma tendência de privilegiar aquele que é o partido no poder no momento e também o seu candidato".

"Nós podemos ver isso todos os dias mesmo nos noticiários", exemplifica o responsável, adiantando que "além do espaço de antena que é reservado a cada um dos partidos, a rádio pública tem acompanhado todos os passos daquele que é o candidato do partido no poder".

"Muitas vezes até se confunde aquilo que é o candidato e a sua figura enquanto presidente da República", conclui Godinho Cristóvão.

Sindicato dos Jornalistas quer impedir limites ao trabalho dos repórteres

Agir parece ser a palavra de ordem quando as organizações contactadas pela DW África deixam um apelo aos jornalistas para que estejam especialmente conscientes, nesta altura, do seu papel de informar imparcialmente a população.

Perante a decisão da Assembleia Nacional angolana de restringir a actuação dos repórteres durante o acto eleitoral, limitando os locais e horários de cobertura, o Sindicato dos Jornalistas já decidiu quais as medidas a tomar: “Nós estamos no momento de agir. Portanto, vamos pedir um encontro com o presidente da CNE, porque queremos saber qual é a fundamentação legal para essa determinação", explica Luísa Rogério.

O Sindicato promete ainda recorrer ao Tribunal Constitucional já que, segundo a secretária-geral, "podemos estar numa situação de flagrante violação da Constituição e também das lei da imprensa e das eleições".

A estrutura sindical já anunciou que irá divulgar, esta quarta-feira, os resultados preliminares do relatório de monitorização dos meios de comunicação angolanos que está a levar a cabo desde o dia 31 de Julho. A prova, de acordo com Luísa Rogério, de que há favorecimento e desequilíbrios na cobertura da campanha eleitoral.

Autora: Maria João Pinto - Edição: António Rocha

AS FRAUDES, SEGUNDO A UNITA…




Eugénio Costa Almeida* – Pululu*

A “povoação de Bumba Tembo Lovua, no município do Chitato, na Lunda-Norte, que o mapeamento da CNE aparecem 992 eleitores quando lá vivem apenas 200 eleitores. Chilondo no mesmo município, tem 233 eleitores, e o mapeamento indica um total de 841 eleitores.”

Uauu!!!

Isto está no memorando que a UNITA, através de Isaías Samakuva, terá apresentado à CNE com um rol de alegadas fraudes que a CNE, até ao momento, não rebateu nem contestou, ou seja, está muda e queda (pode ler o memo, na íntegra, no portal do Club-k)

Uma das alegadas fraudes, prende-se com a citação inicial.

Não vejo onde está a tal fraude, se nas últimas eleições houveram mais votantes que eleitores numa das províncias do Norte de Angola e, que se saiba, até hoje, nunca as mesmas foram questionadas nem postas em causa.

Logo…

* Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

NO HUAMBO CHEIRA A DERROTA DO MPLA




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

José Eduardo dos Santos decidiu excluir a província do Huambo do seu calendário de deslocações eleitorais. Razões? Fernando Faustino Muteka e o MPLA estão a sentir o cheiro da derrota.

Por mérito da UNITA e muita prepotência de Faustino Muteka, governador provincial e primeiro secretário do MPLA, o Povo acordou e, mesmo temendo represálias de todo o género, mostra-se disposto a lutar, a voltar a lutar, pela sua dignificação.

Dez anos depois, são muitos os que se recordam e recordam que, no dia 24 de Fevereiro de 2002, alguém lhes disse: “sekulu wafa, kalye wendi k'ondalatu! v'ukanoli o café k'imbo lyamale!” (morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratados).

E é esse Povo que, de barriga vazia, sem assistência médica, sem casas, sem escolas, parece ter acordado do enorme pesadelo que lhe foi imposto pelo MPLA. E esse povo que, como dizia o arcebispo da minha cidade (Huambo), D. José de Queirós Alves, ainda não tem força mas tem razão.

Talvez no dia 31 consiga esse bom Povo mostrar que, mantendo a razão, ganhou mais força. Esse é um Povo que tem memória, que não esquece,

E não esquece, entre muitas outras coisas, que no dia 12 de Janeiro de 2008 o então Ministro da Defesa de Angola, Kundy Paihama, “botou faladura” num comício na Sede do Município da Matala e prestou um alto serviço ao país e até, digo-o em consciência, ao mundo democrático.

“Não percam tempo a escutar as mensagens de promessas de certos Políticos”, disse com o seu habitual brilhantismo oratório o então ministro da Defesa do MPLA e do regime que (des)governa Angola desde 1975, acrescentando: “Trabalhem para serem ricos”.

A maioria do povo angolano, 68%, que vive abaixo da linha de pobreza entendeu a mensagem.

Digam lá que Kundy Paihama não é o espelho fiel do rei Eduardo dos Santos, o tal que hoje, como em 2008, promete um "caminho seguro para uma Angola melhor"?

Continuemos apelando à memória para bem dos milhões que têm pouco ou nada e que, ao contrário dos generais que compram quintas em Portugal para produzir vinho, nem dinheiro têm para um copito, com as verdades de Kundy Paihama que, digo eu, deveriam fazer parte das enciclopédias políticas das universidades angolanas e, porque não?, de todo o mundo civilizado.

“Durmo bem, como bem e o que restar no meu prato dou aos meus cães e não aos pobres”, afirmou Kundy Paihama. Não, não há engano. Reflectindo a filosofia basilar do MPLA, disse exactamente isso: o que sobra não vai para os pobres, vai para os coitados dos cães.

A maioria do povo angolano, 68%, que vive abaixo da linha de pobreza entendeu a mensagem.

E por que não vai para os pobres?, perguntam os milhões, os tais 68%, que todos os dias passam fome. Não vai porque não há pobres em Angola. E se não há pobres, mas há cães…

Continuemos com o discurso de Kundy Paihama: “Eu semanalmente mando um avião para as minhas fazendas buscar duas cabeças de gado; uma para mim e filhos e outra para os cães”.

É claro que, embora reconhecendo a legitimidade que os cães de Kundy Paihama e do regime que (des)governa Angola desde 1975 têm para reivindicar uma boa alimentação, os angolanos que não são do MPLA parecem não querer transformar-se em cães para ter um prato de comida.

Será, portanto, com o voto de todos eles que vão ajudar Angola a mudar, de modo a que todos os que não pensam como Kundy Paihama tenham direito a comer como os cães do regime.

Entretanto, a UNITA acredita que cada vez mais os “angolanos começam a perceber melhor os desvios dos objectivos da paz e da reconciliação nacional”.

Tem razão. Mas, como se sabe, se nem nas democracias basta ter razão, num regime de partido único travestido com alguns laivos de democracia, como é Angola, ter razão é o que menos conta.

Diz a UNITA que em Angola “continua a violação dos Direitos, Liberdades e Garantias fundamentais dos cidadãos angolanos, consubstanciada nas detenções arbitrárias, particularmente nas zonas onde a UNITA goza de maior simpatia”.

Nada de novo. É assim em Angola, tal como é assim na colónia angolana de Cabinda. Os donos do país, com a criminosa conivência da comunidade internacional, casos da ONU, UA e CPLP, continuam a comer lagosta e a dar ao Povo peixe podre, fuba podre (ou farelo), cinquenta angolares e porrada se refilares.

Enquanto Angola for o MPLA e o MPLA for Angola, de nada adiantará ter razão. A UNITA sabe-o bem. Aliás, parte dela trocou também a mandioca pela lagosta. E quando assim é...

Dizer que o regime liderado, recorde-se, por um presidente que está no poder há 33 anos sem nunca ter sido eleito, é contra todas as formas de luta que ponham em causa o seu reinado, é chover no molhado. Ninguém se preocupa com isso.

Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacional reconhece mas sem a qual não sabe viver. Aliás, é mais fácil roubar o Povo em regimes corruptos do que em democracias.

Aliás, basta ver como as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investem forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios.

“Contínua a degradação da situação socioeconómica e cultural, estando na base do aumento dos níveis de violência, delinquência, pobreza e doenças endémicas que o País conheceu”, afirma a UNITA, acrescentando que continuam as práticas que reforçam o Estado patrimonialista e clientelista, visando condicionar a vontade e a consciência dos cidadãos, mediante voto prévio e induzido para o partido no Poder”.

O MPLA tem tanta força que, para além de os mortos também votarem nele, há sempre aquela variante que legitima as boas democracias e que respeita ao facto de em alguns círculos eleitorais apareceram mais votos do que votantes.

Reconheça-se que é obra apresentar resultados (obviamente democráticos) em que o MPLA ultrapassa os 100 por cento das votações.

Enquanto a UNITA não perceber que está a fazer de figurante para legitimar uma democracia inexistente, que está a fazer de porteiro para o regabofe dos ditadores, que está com uma bandeja de prata à procura de comida nos caixotes do lixo dos donos do reino, nunca conseguirá mudar Angola.

Mas, talvez mais importante do que tudo, a democracia não será edificada em Angola enquanto, como dizia o Mais Velho, não for a dor que nos faz andar, a angústia que nos faz correr, as lamúrias e as lamentações, que de vários cantos do país nos chegam, que nos fazem trabalhar; não for a razão dos mais fracos contra os mais fortes que nos faz marchar.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.


The Economist I. U. - Economia do Brasil: Lançado novo plano de infraestrutura




Carta Capital - Foto: Wilson Dias / ABr

O fracasso da economia em reagir à flexibilização monetária agressiva e a uma série de medidas fiscais e de crédito desde agosto de 2011 levou o governo brasileiro a lançar um ambicioso plano de estímulos, enfocado nas necessidades de infraestrutura do País, especialmente nas áreas de transportes e logística. Ao reconhecer a capacidade do setor privado de fornecer certos serviços públicos, a iniciativa envia um sinal muito positivo aos investidores, mas a probabilidade de um aumento transformador no índice geral de investimentos é pequena, enquanto os desafios da implantação também serão substanciais.

Em 16 de agosto a presidente Dilma Rousseff lançou o Plano Nacional de Logística Integrada (PNLI), seguindo outras tentativas recentes de intensificar a atividade de setores específicos da economia, como o Plano Brasil Maior, anunciado em agosto de 2011, e planos associados a ele — Plano Brasil Maior 2, em abril de 2012, e o chamado PAC Equipamentos, anunciado em junho. Mas enquanto o Plano Brasil Maior se concentrava em ajudar a atividade industrial através de incentivos fiscais, programas de compras do governo e exigências polêmicas de conteúdo local, o plano atual é especificamente destinado a abordar a crescente evidência de que o governo deixou de produzir os muito necessários melhoramentos em infraestrutura através do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado com muita fanfarra no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2007, ou o PAC2, por Rousseff em 2011. E os gargalos de infraestrutura estão prejudicando a competitividade do Brasil, o que explica em parte por que o setor manufatureiro vem se contraindo há mais de um ano.

Reforçar o crescimento concentrando-se nas falhas de infraestrutura

Sob o PNLI, o governo anunciou investimentos de até R$ 133 bilhões nos próximos 25 anos, dos quais R$ 80 bilhões deverão se materializar nos próximos cinco. Esses projetos se concentram nas rodovias e ferrovias do país, expandindo a rede atual para ligar áreas chaves de produção aos portos e outros pólos de distribuição. Como parte do programa, estão planejadas concessões para cerca de 7.500 quilômetros de rodovias (incluindo nove autopistas) em seis Estados diferentes. O critério de seleção será o concorrente que oferecer a menor tarifa pelo serviço (e o governo não busca uma receita que seria em última instância adicionada às tarifas), e os leilões deverão ocorrer em abril de 2013. O pacote também cobre uma parceria público-privada para cerca de 10 mil quilômetros do sistema ferroviário (cobrindo 12 ferrovias), pela qual o setor privado construirá a rede, enquanto a Valec, uma companhia estatal antes responsável pela construção de ferrovias, administrará a capacidade e a venderá para terceiras, retornando a receita obtida para companhias privadas.

As condições de financiamento para o setor privado são atraentes, com cerca de 65% a 80% dos projetos financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) de 5,5% mais 1,5%, com maturidades de 20 anos e período de graça de três anos. O governo espera com esse plano duplicar a capacidade das principais rodovias do Brasil. O pacote para estradas e ferrovias deverá ser seguido por um anúncio semelhante para a concessão de portos e aeroportos nas próximas semanas.

Presidente toma uma medida ousada

Embora o anúncio tenha sido amplamente antecipado, ao vazar para a imprensa, é de todo modo uma medida ousada de Rousseff em termos políticos, considerando que seu Partido dos Trabalhadores (PT) foi historicamente contrário a qualquer forma de privatização — notadamente a das companhias estatais nos anos 1990, sob governos do Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB). Ao reconhecer a maior capacidade do setor privado de fornecer certos serviços públicos, o plano envia um sinal muito positivo para os investidores, ajudando a conter as crescentes preocupações sobre a abordagem cada vez mais intervencionista do governo na elaboração de políticas. Com esse pacote de concessões privadas e a promessa de outros, Rousseff parece demonstrar que em seu governo considerações pragmáticas podem ter primazia sobre tendências intervencionistas. O governo espera que isso ajude a reparar a infraestrutura deficiente do país antes dos grandes eventos esportivos mundiais que o Brasil abrigará em 2014 e 2016. Dito isso, o maior desafio ainda será tirar essas concessões da prancheta, devido à problemática burocracia que permeia todos os níveis de governo — federal, estaduais e municipais.

Mas a nova medida será suficiente para levantar os índices de investimento de modo significativo?
De uma perspectiva de médio a longo prazo, o PNLI deverá ser positivo para o país, desde que não haja atrasos ou reveses substanciais em sua implementação. Apesar de a iniciativa enviar sinais positivos e mostrar a disposição do governo para atacar problemas difíceis, é improvável que seja suficiente para ajudar direta ou indiretamente a levantar o índice geral de investimentos dos 18% do PIB atuais para níveis de 23 a 25%, índices necessários para sustentar o crescimento de 5% do PIB, mais alinhado com os índices de outras grandes economias latino-americanas. Para que isso aconteça, o investimento teria de crescer algo perto de 9% ao ano em 2013-16, o que parece irreal sem outras reformas (trabalhista, fiscal e administrativa). Mesmo durante os anos de crescimento do Brasil, entre 2004 e 2010, o investimento aumentou menos de 8% por ano em média.

Embora o plano de infraestrutura pareça indicar uma virada positiva na mentalidade do atual governo — envolver o setor privado para abordar necessidades de infraestrutura que o setor público evidentemente não conseguiu suprir — ainda não consegue abordar plenamente as precondições para tornar o Brasil “mais rico, mais forte, mais competitivo e mais moderno”, como disse Rousseff ao lançar o PNLI.


EIKE ROUSSEFF




O maior empresário brasileiro e a presidente do Brasil são inseparáveis

João Almeida Moreira – Dinheiro Vivo

Como todas as semanas, na tarde de 16 janeiro de 1970 a operacional Wanda foi encontrar o operacional Olavo Ribeiro num bar da Rua Augusta, coração de São Paulo, para discutir as ações seguintes da Vanguarda Armada Revolucionária, organização de combate à ditadura militar.

Nesse dia, mal chega, Wanda vê Olavo rodeado de polícias. Instintivamente, dá meia volta e sai do bar com passo apressado. Mas um dos polícias desconfia, segue-a e revista-a. Descobre uma arma. Foi presa na hora e torturada nos três anos seguintes. Na prisão, diz quem conviveu com Dilma, o seu verdadeiro nome, que leu tudo o que podia de economia e familiarizou-se com histórias idênticas à sua de "camaradas" do mundo inteiro – como Álvaro Cunhal, por exemplo. Mais tarde seguiu a carreira política e foi subindo, escalão a escalão, até chegar à presidência do Brasil pelo Partido dos Trabalhadores (PT).

Nesses mesmos anos 70, o jovem Eike Batista vivia entre a Suíça e a Alemanha para onde o pai, gestor de grandes empresas brasileiras e internacionais na época da ditadura militar, fora transferido. Cursou engenharia, sem concluir, e andou por Aachen a vender seguros de porta em porta, atividade que, segundo o próprio, lhe deu bagagem para lidar com situações negociais stressantes no futuro. Não consta que soubesse quem era Álvaro Cunhal mas conhecia de cor os feitos dos Rockefeller e dos Rothschild. Investiu mais tarde na exploração de petróleo e tornou-se multimilionário. Hoje é o homem mais rico do Brasil, oitavo do mundo.

Se se conhecessem nos anos 70, Dilma e Eike seriam inimigos. Mas, como no “Les Intouchables” (blockbuster francês com tiques de Hollywood recém chegado a São Paulo) um ex-recluso e um multimilionário aos poucos se tornam unha com carne, também Dilma e Eike são hoje amigos inseparáveis.

Já em abril, quando visitou o Porto Açu, maior conglomerado portuário-industrial da América latina e propriedade de Eike Batista, a presidente elogiou durante 15 minutos, sem pausas para respirar, o megaempresário, sugerindo ainda parcerias entre o seu grupo, o EBX, e a estatal Petrobras. Eike, financiador da campanha do rival José Serra, do PSDB (centro-direita), respondeu com sorrisos e juras de amor ao governo PT.

Na semana passada, a presidente anunciou o maior investimento de sempre em parceria com privados na área dos transportes rodoviários e ferroviários – 53,5 mil milhões de euros – a que se seguirão outros em aeroportos e portos. “Isto é um kit felicidade para o país”, disse o mais entusiasmado dos convidados da cerimónia, que não era nenhum ministro do Governo, mas sim, nada mais nada menos, que o ex-vendedor de apólices Eike Batista.

Antes do anúncio, Dilma não perdeu a oportunidade de homenagear “um dos homens que mais se destacou na criação de infraestruturas no país”, Eliezer Batista, o tal grande empresário da época da ditadura militar e pai de Eike.

Membros do núcleo mais ortodoxo do PT, sentados em poltronas ao lado da família Batista, sentiram-se incomodados. Mais ainda porque, à porta da sala da cerimónia, grevistas mobilizados pela CUT, a união dos sindicatos brasileiros e berço do partido, reclamavam melhores salários. Dois ou três desses veteranos ainda se entreolharam breves momentos, divididos entre a fidelidade ao passado de "camaradas" e o conforto do presente e futuro de governantes. Mas logo esqueceram a operacional Wanda e aplaudiram de pé a presidente Dilma.

*Jornalista - Escreve à quarta-feira, em Crónicas de um português emigrado no Brasil

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