sexta-feira, 27 de abril de 2012

COMANDO MILITAR GUINEENSE LIBERTOU PM E PR EM ACORDO COM CEDEAO




Presidente interino e primeiro-ministro foram libertados - fonte familiar

MB - Lusa

Bissau, 27 abr (Lusa) - O Presidente interino da Guiné-Bissau, Raimundo Pereira, e o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, ambos detidos desde o golpe de Estado de 12 de abril, foram hoje libertados, disse à Lusa uma familiar do chefe do Governo.

De acordo com Fátima da Velha, sobrinha de Carlos Gomes Júnior, o primeiro-ministro guineense seguiu num avião em que viajaram os chefes das Forças Armadas de três países da Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO) que visitaram Bissau hoje.

"O meu tio saiu. Sei que ele foi no mesmo avião com aquele grupo da CEDEAO. É um sentimento indescritível", disse Fátima da Velha, que dançava e cantava em frente da sede do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), partido no poder agté ao golpe do dia 12, de que Carlos Gomes Júnior é líder.

No mesmo avião também seguiu Raimundo Pereira, Presidente interino do país, que igualmente estava detido.

O Presidente interino e o primeiro-ministro são esperados hoje em Abidjan, segundo disse agência france Presse fonte da Presidência da Costa do Marfim.

Centenas de populares de Bissau afluíram hoje à sede do PAIGC logo que a notícia da libertação de Carlos Gomes Júnior e de Raimundo Pereira se começou a espalhar pela capital guineense.

"É impossível explicar aquilo que eu estou a sentir neste momento, que o povo está a sentir, que o PAIGC está a sentir", reforçou Fátima da Velha, entre abraços de mulheres do partido que também não escondiam a sua satisfação.

"Sei que ele viajou. Fui informada pelos colegas", sublinhou Fátima da Velha, funcionária do aeroporto internacional Osvaldo Vieira de Bissau.

A sobrinha de Carlos Gomes Júnior diz ainda que a libertação de Carlos Gomes Júnior e de Raimundo Pereira ficou a dever-se "à boa compreensão do Estado-Maior General das Forças Armadas".

"Acho que chegaram à conclusão de libertar o Carlos Gomes Júnior e o Raimundo Pereira para resolver este problema, para começar a dar os primeiros passos para a resolução deste problema", defendeu a sobrinha do primeiro-ministro guineense.

Fátima da Velha destacou ainda o facto de que, a partir de agora, Carlos Gomes Júnior está em liberdade e "pode receber um bom tratamento médico" já que, diz, ele sofre de diabetes.

"Ninguém gosta de ter um familiar preso e muito menos nas mãos de militares", afirmou Fátima da Velha, mostrando-se confiante de que Carlos Gomes Júnior não abandonará a política.

"Contamos que ele vai ser Presidente uma vez, duas vezes, porque uma pessoa que foi escolhida pelo povo, vai continuar a ganhar nas urnas. 'Cadogo' [nome por que é popularmente conhecido] é o Mandela da Guiné-Bissau", enfatizou a sobrinha

Raimundo Pereira e Gomes Júnior podem integrar governo de transição, diz Comando Militar

Bissau, 27 abr (Lusa) - O porta-voz do Comando Militar que tomou o poder no dia 12 de abril na Guiné-Bissau admitiu hoje que o o primeiro-ministro e o Presidente interino hoje libertados possam integrar um governo de transição.

Se Raimundo Pereira for Presidente será Presidente de um governo de transição, se Carlos Gomes Júnior for primeiro-ministro será de um governo de transição, "não será primeiro-ministro no resultado das eleições anteriores", disse Daba Na Walna em conferência de imprensa.

Se o PAIGC (maior partido, no poder até dia 12) "apresentar Carlos Gomes Júnior para o governo de transição será uma proposta boa para estudar", disse o porta-voz em resposta aos jornalistas, acrescentando que "tudo está em aberto" e que o Governo eleito foi afastado.

Populares festejam "libertação" do primeiro-ministro e PR interino na sede do PAIGC

Bissau, 27 abr (Lusa) -- Dezenas de pessoas estão concentradas em Bissau na sede do PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde), no poder até dia 12, a festejar a "libertação" do primeiro-ministro e do Presidente interino.

Fontes militares disseram à Lusa que o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, e o Presidente interino, Raimundo Pereira, detidos no dia 12 de abril, na sequência do golpe militar na Guiné-Bissau, partiram hoje no mesmo avião que trouxe os elementos do Comando Militar que participaram quinta-feira numa cimeira extraordinária da CEDEAO, no mesmo país.

Numa conferência de imprensa realizada hoje em Bissau, questionado pela Lusa, o porta-voz do Comando Militar, Daba Na Walna, disse que não confirmava a libertação de Carlos Gomes Júnior e de Raimundo Pereira.

Timor-Leste: Somos um "povo de boa memória", "um povo grato" [a Portugal] -- MNE



NV - Lusa

Lisboa, 27 abr (Lusa) -- O ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste, Zacarias da Costa, afirmou hoje, em Lisboa, que os timorenses são "um povo de boa memória, um povo grato", que jamais esquecerá a ajuda prestada por Portugal.

Numa receção promovida pela embaixada timorense, para assinalar o décimo aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas entre Timor-Leste e Portugal, Zacarias da Costa destacou que os dois países têm um relacionamento singular, baseado "na amizade, fraternidade e afeto".

"Portugal defendeu dignamente a autodeterminação de Timor-Leste a nível internacional (...). Nunca desistiu da defesa dos nossos direitos (...). Foi um verdadeiro aliado e amigo dos timorenses", afirmou o governante timorense, perante entidades portuguesas e representantes do corpo diplomático.

Na cerimónia, que contou também com as presenças da embaixadora de Timor-Leste em Lisboa, Natália Carrascalão, e do secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação português, Luís Brites Pereira, o MNE timorense referiu ainda que será "com base na amizade secular (entre os dois países, colonizador e colonizado) que deverão ser construídas "as relações futuras".

No âmbito das relações diplomáticas, Zacarias da Costa lembrou o apoio ao desenvolvimento concedido por Portugal a Timor-Leste nas áreas da educação, justiça, segurança e saúde, desafiando depois os empresários a terem também um papel ativo nas relações entre os dois países.

Numa breve intervenção, o secretário de Estado Luís Brites Pereira, em representação do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros português, Paulo Portas, corroborou totalmente as palavras de Zacarias da Costa, adiantando que o relacionamento fraterno e secular entre os dois países "tem muito futuro", mas cabe aos governantes concretizá-lo.

CPLP perdeu liderança para a CEDEAO no processo de estabilização - investigadora



CFF

Lisboa, 27 abr (Lusa) - A investigadora portuguesa Elisabete Azevedo-Harman considerou hoje que o bloco lusófono foi ultrapassado pela comunidade de países da África Ocidental na liderança do processo de estabilização da Guiné-Bissau, restando-lhe agora integrar-se nas decisões tomadas.

A Comunidade Económica de Países da África Ocidental (CEDEAO) aprovou quinta-feira o envio de um contingente entre 500 a 600 militares para a Guiné-Bissau, onde desde 12 de abril um grupo de militares detém o poder e mantém presos o Presidente interino, Raimundo Pereira, e o primeiro-ministro e candidato presidencial, Carlos Gomes Júnior.

Foi ainda dado um ultimato de 72 horas aos militares golpistas para acatarem as exigências da organização.

"A CPLP tem um papel um bocadinho ingrato neste momento e tudo o que vier fazer já é posterior ao que a CEDEAO fizer e tem que se integrar naquilo que a CEDEAO anunciou. A CEDEAO ganhou em termos de tempo e a CPLP tudo o que vier a fazer tem que ser em consonância com a CEDEAO", disse à agência Lusa Elisabete Azevedo-Harman, recém-regressada da Guiné-Bissau.

A professora de ciência política da Universidade Católica, que estava em Bissau a desenvolver um trabalho de investigação sobre a democratização do país, considera que a CEDEAO se antecipou ao bloco lusófono e assumiu a liderança na procura de soluções para a crise política na Guiné-Bissau, sublinhando a ausência de Portugal e de Angola na força militar.

"A CEDEAO tomou as rédeas neste momento [...]e isso é do agrado dos militares", disse a investigadora, admitindo que os militares revoltosos têm reservas relativamente a Angola, por causa da missão militar que tem no terreno [MISSANG], e a Portugal devido à sua posição de solidariedade com os angolanos.

"Há uma situação um bocadinho ambígua: temos a CPLP a tentar liderar o processo com discursos de Portugal e Angola no Conselho de Segurança [das Nações Unidas], mas temos a CEDEAO a antecipar-se a qualquer decisão e, possivelmente até, a recusar cooperação com a CPLP", acrescentou a investigadora.

Considerou que a CEDEAO podia assumir, na declaração final da cimeira extraordinária sobre a situação na Guiné-Bissau, que o plano para a estabilização do país era feito em conjunto com a CPLP e que, uma vez que já há tropas angolanas no terreno, combinar com elas a operação, mas não o fez.

Elisabete Azevedo-Harman acredita que a CEDEAO tem um "ponte facilitada" com os militares e que se eles cederem às exigências da organização será possível construir uma ponte com o PAIGC, partido que detinha o poder na Guiné-Bissau e que os golpistas querem excluir de uma solução futura.

"O papel da CPLP nesta equação é uma incógnita", disse.

A investigadora considerou que a CEDEAO, a CPLP e o Conselho de Segurança da ONU são "variáveis externas com muita importância", mas sublinhou que "o problema dentro da Guiné-Bissau" é não poder haver uma solução só com os militares ou só com o PAIGC.

"Fazer esta equação é que é muito difícil neste momento porque há um braço-de-ferro nítido entre o PAIGC - que estava no poder e tinha legitimidade eleitoral e os militares que têm a legitimidade histórica da criação do país e que são uma força também política na Guiné-Bissau. A ponte entre estes dois é que vai ser complicada de gerir[...] com uns a tomar partido exterior com uma força e outros a serem mais apoiados por outra força internacional", adiantou.

A investigadora diz que foi do cruzamento da insatisfação dos militares relativamente à presença angolana no país conjugada com o período eleitoral que se vivia na Guiné-Bissau, que preparava a segunda volta das eleições presidenciais, que resultou a tomada do poder pelas forças armadas, adiantando que só a resolução dos problemas dos militares poderá trazer estabilidade ao país.

"Uma das componentes essenciais é a reforma das forças armadas. Já houve várias tentativas, mas nunca houve uma reforma a sério. As forças armadas herdam problemas da guerra de libertação, da guerra de 1998 e enquanto as forças armadas não estiverem satisfeitas com o seu posicionamento na sociedade e com as suas condições de vida não vai haver possibilidade de uma democratização", disse.

SEJA FEITA A VONTADE DO SOBA MAIOR




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

Durante a última campanha eleitoral em Angola, que deu mais de 80% dos votos ao MPLA, o partido de José Eduardo dos Santos prometeu a construção de um milhão de novas casas e a criação de milhões de novos empregos.

Além disso, como poucos se recordam, como cada vez menos se recordam, como ainda menos estão interessados em recordar, prometeu aos angolanos o fim da exclusão social, a consolidação da democracia e a restauração dos valores morais.

E assim, vários projectos habitacionais estão em curso, ou em vias disso, ou em vias de estar em vias, em todo o país, seja por iniciativa pública, seja privada (no caso de Angola não sei bem qual é a diferença).

O Governo do MPLA mantém que a construção de habitações sociais é uma das prioridades. Se calhar é por isso que a maior parte dos projectos habitacionais decorrem em Luanda onde, segundo revelou em tempo útil o Notícias Lusófonas citando o próprio ministro o Urbanismo e Construção, faltam 1,7 milhões de habitações.

Os projectos localizados nos municípios do Kilamba Kiaxi, Cacuaco, Viana (Zango) e quilómetro 44 são os mais conhecidos, diz o próprio “Jornal de Angola”, pormenorizando que o complexo habitacional do Kilamba Kiaxi vai beneficiar 160 mil habitantes, com a conclusão de 20 mil apartamentos, até 2011.

No projecto do Quilómetro 44, diz o JA, estão a ser erguidas duas mil casas, cujos beneficiários, na sua maioria, serão os funcionários do futuro aeroporto de Luanda.

Continuando a citar o órgão oficial do Governo, o projecto do Cacuaco vai ser construído em três fases e no final tem 30 mil apartamentos, em prédios de cinco a 11 andares, estando agora em fase de execução dez mil apartamentos que ficarão prontos em dois anos e meio.

Saindo da capital, no Huambo está em execução um projecto habitacional que contempla a construção de 130 moradias, num investimento de 500 milhões de dólares.

Na Huíla, 25 mil novas casas de renda económica são construídas a partir deste ano. Numa primeira fase vão ser edificadas na cidade do Lubango mais de duas mil habitações, e outras mil nos municípios da Matala e da Chibia.

A região Leste - províncias do Moxico, Lunda-Norte e Lunda-Sul -, vai beneficiar de 28 mil habitações sociais. O projecto compreende a construção de 20 mil casas na cidade do Dundo (Lunda-Norte), cinco mil em Saurimo (Lunda-Sul) e três mil no Luena (Moxico).

E enquanto esperam, sentados à porta da cubata, os angolanos ficam a pensar no facto de Angola figurar na lista dos países africanos que apresentaram uma grande taxa de crescimento económico, tendo como motor a extracção do petróleo. Ficam, também, a meditar na certeza de que os moradores em bairros de barracas são a maioria, mais de 80 por cento da população urbana.

Recordam-se, por mero acaso – é óbvio, que segundo revelou em 2009 a organização não-governamental Parceria África-Canadá (PAC), uma sociedade de generais angolanos ganhou perto de 120 milhões de dólares (83 milhões de euros), nos últimos dez anos, com uma participação “silenciosa” no negócio dos diamantes?

Na Revista Anual da Indústria dos Diamantes 2007 dedicada a Angola, a ONG afirmava que abundam por todas as regiões mineiras angolanas casos como o da “Lumanhe Extracção Mineira, Importação e Exportação”, em que empresas “aliadas do governo” impõem a sua presença em projectos de exploração, um negócio que deverá render vários milhares de milhões de dólares nas próximas décadas.

“Na corrida para conseguir uma parte da indústria angolana de diamantes, a Lumanhe demonstrou ser extremamente afortunada, captando uma participação de 15 por cento nos projectos aluviais de Chitotolo e Cuango, e uma participação de percentagem semelhante no projecto de exploração em Calonda”, afirmava o relatório.

A empresa tem como sócios António Emílio Faceira, Armando da Cruz Neto, Luís Pereira Faceira, Adriano Makevela McKenzie, João Baptista de Matos e Carlos Alberto Hendrick Vaal da Silva, cinco dos quais generais das Forças Armadas de Angola.

De acordo com a PAC, o rendimento anual da “empresa dos generais” passou de cinco milhões de dólares em 1997 para 22 milhões de dólares em 2006.

No total, o rendimento no período foi de 120 milhões de dólares, o equivalente a dois milhões de dólares por general, por ano.

“Os investidores estrangeiros que actuam em Angola parecem ter incluído essas transferências de dinheiro simplesmente como fazendo parte dos custos de negociação. Contudo, ao reivindicarem cinco a 25 por cento de cada projecto, essas empresas aliadas do governo não estão a tirar dinheiro ao governo ou aos investidores. É o povo angolano que paga o preço”, afirmava.

“A pergunta fundamental”, dizia a ONG, é “o que os angolanos poderiam ter feito com esse dinheiro”, que equivale ao necessário para construção de cem hospitais provinciais como o do Dondo, capital da Lunda Norte, no valor de 1,25 milhões de dólares.

“Os 120 milhões de dólares recebidos pelos generais dariam para construir 150 escolas e pagar a 800 professores um salário mais digno de 300 dólares todos os meses durante 25 anos, sobrando ainda dinheiro para giz, papel e canetas”, afirmava a PAC.

De acordo com a ONG, existem um pouco por todas as regiões produtoras de diamantes“projectos de mineração onde as empresas angolanas apoiantes do governo retiram a sua parte”.

Entre as recomendações da ONG ao governo angolano estava a realização de leilões ou licitações para atribuição das participações em sociedades mineiras, e que os ganhos destes sejam encaminhados para projectos sociais nas regiões diamantíferas.

“O governo angolano e a Endiama devem deixar de oferecer grandes percentagens dos projectos de sociedade conjunta às empresas angolanas apoiantes do governo. Todos os vínculos nominais que existem entre as áreas de concessão e as empresas angolanas deveriam ser cancelados”, defendia o relatório.

Além disso, adiantava, o executivo e a Endiama deve “trabalhar a questão da distribuição dos benefícios do sector diamantífero angolano», uma vez que os beneficiados actualmente resumem-se ao governo, empresas e aos amigos do governo, «e pouco é retribuído aos moradores das regiões que produzem diamantes”.

Conclusão? Nas próximas eleições, se as houver, o MPLA via ter bem mais do que 80% dos votos…

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: E QUE TAL APRENDER COM PASSOS COELHO?

Guiné-Bissau: PR de Cabo Verde nega papel secundário da CPLP na gestão da crise



JSD - Lusa

Cidade da Praia, 27 abr (Lusa) - O Presidente de Cabo Verde negou hoje que a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) tenha sido relegada para um plano secundário pela organização da África Ocidental na gestão da crise político-militar na Guiné-Bissau.

O Presidente cabo-verdiano defendeu que a questão diz respeito à África Ocidental e que, como tal, cabe à Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) liderar o processo negocial, frisando, porém, que a CPLP tem tido um papel "participativo" nas conversações.

O chefe de Estado cabo-verdiano, que participou quinta-feira, em Abidjan, na cimeira extraordinária da CEDEAO, lembrou que também o secretário-executivo dos "oito", o guineense Domingos Simões Pereira, esteve presente no encontro na capital marfinense.

Jorge Carlos Fonseca lembrou que também o presidente em exercício do Conselho de Ministros da CPLP e chefe da diplomacia angolana, George Chicoti, se deslocou a Abidjan para participar ativamente" na cimeira, e que outros países dos "oito", como Portugal e Brasil, têm feito diligências nas organizações internacionais

"A CEDEAO entendeu que deveria criar uma força na África Ocidental. Mas essa força é também inclusiva, pois é criada em concertação com a União Europeia, União Africana, Nações Unidas e CPLP, bem como até pelos Estados Unidos e França, que fornecerão outro tipo de apoios", sustentou o Presidente de Cabo Verde.

Para Jorge Carlos Fonseca, subjacente à força da CEDEAO a enviar para a Guiné-Bissau, que deverá englobar cerca de 600 efetivos militares da Nigéria, Burkina Faso, Senegal e Togo, existe "o princípio da subsidiariedade", pois qualquer uma das organizações ou qualquer país poderá solicitar a participação na missão.

"Há questões de pormenor, de força, de ajustamentos. Por exemplo, não está excluída a participação do Brasil nos esforços de intervenção. Mas se me fala de Angola, havendo lá o problema da Missang [missão militar angolana em Bissau, posta em causa pelos militares golpistas], que já esteve e vai sair, não estará excluída, como país africano ou da CPLP, mas talvez se deva perceber que seria mais fácil estarem tropas de outros países", disse.

Afirmando que, para Cabo Verde, Angola "não é empecilho", Jorge Carlos Fonseca disse, porém, que "não se pode esquecer" que os militares guineenses justificaram o golpe de Estado de 12 de abril com a presença angolana no país.

"Um dos pretextos oficiais dos golpistas é que uma força angolana estaria preparada para agredir as Forças Armadas da Guiné-Bissau e tomar o país", referiu, referindo, porém, que tal "não corresponde verdadeiramente aos factos".



Brasil: AS QUOTAS PARA NEGROS NAS UNIVERSIDADES




Urariano Mota*, Recife – Direto da Redação

Recife (PE) - Enquanto escrevo, ainda não acabou o julgamento, pelo STF, das cotas para negros na Universidade de Brasília. Às 10 e 15 do Recife numa quinta-feira, o Supremo Tribunal ainda vai se pronunciar sobre uma ação contra as cotas movida pelo DEM, que atende pelo nome de Democratas, e tudo sem ironia. A realidade é que já passou do limite do deboche.

A dar corpo à sua defesa democrática, sem ironia, entendam, o DEM argumenta que o negro sistema transgride, viola diversos preceitos fundamentais fixados pela Constituição de 1988, a saber: a dignidade da pessoa humana, o combate ao preconceito de cor e à discriminação, o que afetaria o próprio combate ao racismo. Mas tudo sem ironia, se conseguem entender. E de tanto usar a observação, a partir de agora usarei apenas TSI, que vem a significar “tudo sem ironia!”.

Dizem os democratas, TSI, que o sistema de cotas fere o princípio meritocrático. Melhor seria dizer, sem TSI, que o DEM reafirma o meritocrático como um mentirocrático, porque torna absoluto o mérito, o mérito que sempre houve para os de sempre, a saber: tudo para os filhos dos bem postos na sociedade de exclusão, os seus vizinhos, sobrinhos, esposa, mãe, os mais próximos enfim, que, é um diabo, todos têm mérito e são filhos de Deus. Mas indo além da defesa do próprio mérito, defendem os democratas TSI que o sistema ofende dispositivos do direito universal para a educação. Você leram bem: cota-para-os-negros-fere-direito-universal-da-educação. TSI! TSI! TSI! ao infinito.

Notem que as cotas para negros se confundem com as cotas para estudantes de escolas públicas, onde não por acaso se encontram os pobres, negros e mestiços do Brasil. E por falar em mérito, um estudo da Universidade de Campinas já demonstrou que os alunos oriundos de escolas estaduais, menos de 30% do corpo discente da Unicamp, possuíam durante o curso médias 5% superiores aos demais - apesar de enfrentarem maiores dificuldades materiais ao longo da permanência na universidade. Mas esse mérito dos que lutam pela educação como uma tábua de sobrevivência, não serve aos Democratas.

Para quem não sabe, as cotas fazem uma compensação às injustiças de renda, família e oportunidades na vida. Nelas, por elas, brasileiros podem entrar em uma universidade, apesar da pobreza, apesar da discriminação geral, apesar dos pais, alguns até inexistentes, mas todos portadores da ignorância e infelicidade recebidos há gerações.

Os novos senhores de engenho do DEM e assemelhados dizem que no Brasil não há negros, pois de tal maneira estamos misturados, que difícil é saber o branco que não tenha uma fração de sangue da senzala. Difícil seria, quando não impossível saber quem é negro. Que queixão, que questão. Ora, todo queimadinho de sol sabe que todos sabem quem é quem, quando lotam as prisões, quando são preteridos para uma chance de vida nos hospitais, quando uma bala perdida sempre vai para a sua pele, ou destino preferencial, digamos, sem TSI.

As cotas são um acordo enquanto no mundo não há justiça. A obra da escravidão é uma longa, angustiosa e interminável história. “Não basta acabar com a escravidão. É preciso destruir sua obra.", dizia Joaquim Nabuco, há dois séculos. E até hoje continuamos no débito. Somos o último país do mundo a terminar a escravidão legal, enquanto discutimos se os negros brasileiros merecem o tratamento de uma discriminação positiva.

Talvez os iluminados da nossa democracia racial não saibam que os nossos jovens de alma branca são sempre os suspeitos, são eles sempre os primeiros a sofrer o vestibular de assassinatos. Esta é a nossa democracia, que escapa à inteligência do DEM: no Brasil, todo negro é alvo para a polícia.

* É pernambucano, jornalista e autor de "Soledad no Recife", recriação dos últimos dias de Soledad Barret, mulher do cabo Anselmo, executada pela equipe do Delegado Fleury com o auxílio de Anselmo.

Aécio complica a vida de Serra ao dizer que desafeto paulista poderá ser candidato em 2014




Correio do Brasil - de São Paulo

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) deixou cair uma gota a mais de veneno na campanha do ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB), que luta para se desvencilhar da imagem de político inconstante, que ñ consegue terminar um mandato sequer. Aécio afirmou, em entrevista divulgada nesta sexta-feira, que ao contrário do que Serra fez questão de reafirmar e, em certa ocasião, assinou até documento em cartório para iludir os eleitores, ele poderá, sim, ser candidato a presidente da República em 2014, mesmo se for eleito prefeito de São Paulo em 2012.

– As circunstâncias lá na frente podem demonstrar que ele (Serra) é a grande alternativa para a sucessão presidencial. Eu não afasto isso de maneira peremptória e definitiva – rasgou Aécio, no fio da navalha afiada de um elogio que, bem ao estilo mineiro, corta mais fundo do que a crítica.

Na entrevista ao diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, Aécio acrescentou também que, para a eleição presidencial de 2014, está “preparado” e “muito competitivo” para disputar o Planalto. Mas afirmou que entre seus defeitos “não está o da obsessão”, em outra crítica velada ao desafeto paulista, e que pode apoiar outro candidato que tiver mais chances de vitória.

O ex-governador mineiro também criticou a presidenta Dilma Rousseff, a quem atribuiu nota cinco, numa escala de zero a dez.

– É bem intencionada, mas ela não consegue fazer o que precisa ser feito. Não consegue fazer o país avançar nas grandes reformas – cutucou.

Sobre a CPI do Cachoeira, instalada no Congresso para investigar as relações de políticos com o empresário Carlinhos Cachoeira, preso e suspeito de chefiar uma máfia de jogos ilegais, Aécio prevê que será cassado o mandato do senador Demóstenes Torres (ex-DEM). O senador disse ainda que todos os citados nos grampos da Polícia Federal e suspeitos de envolvimento com Cachoeira devem ser investigados, inclusive o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB). Sobre o deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), que é amigo de Cachoeira, Aécio disse que o PSDB pode decidir por licenciá-lo.

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Destaque PG

SOBERANIA ENERGÉTICA E REPRODUÇÃO DO CAPITAL EM 2012




Mário E. Burkún (*) – Carta Maior

É imperativo formatar uma matriz produtiva regional, especialmente entre Brasil e Argentina, na qual o custo da energia facilite uma proteção efetiva da produção independente das oscilações cambiais. Para isso, um trabalho comum entre YPF e Petrobras na produção e extração de petróleo off shore no Atlântico pode ser um passo importante, acompanhado de planos energéticos mais amplos com vistas a uma acumulação de longo prazo para o conjunto da Unasul. O artigo é de Mario E. Burkún.

Buenos Aires - A decisão do governo argentino de nacionalizar 51% do capital da companhia YPR-Repsol tem um impacto muito significativo na atualidade econômica argentina e internacional. Na etapa atual da globalização a disputa pelas matérias primas é uma das bases de sustentação dos conflitos nas relações internacionais. Dentro destas matérias primas não renováveis, o petróleo e o gás são os principais componentes de incerteza na projeção dos volumes de utilização assim como da evolução dos preços.

A posse destes insumos influencia o custo de produção empresarial e termina sendo um componente chave para a guerra comercial em um comércio cada vez mais protegido e submetido à incerteza do movimento da especulação financeira e das dificuldades monetárias.

Para a Argentina voltar a poder regular o mercado nacional de petróleo e gás tem como objetivo poder orientar a renda petroleira na direção do mercado de investimento produtivo, limitando a sucção do rendimento empresarial da Repsol via a descapitalização da companhia e a não utilização de parte do lucro para garantir uma exploração no longo prazo.

A mudança mais significativa será observada no médio e longo prazo, quando mudar a política energética nacional. É uma necessidade mudar a matriz energética, dirigindo o investimento à exploração e à obtenção da autossuficiência da indústria nacional para sustentar o crescimento evitando o estrangulamento da balança de pagamentos pela importação de energia.

Ao mesmo tempo, é imperativo formatar uma matriz produtiva regional, especialmente entre Brasil e Argentina, na qual o custo da energia facilite uma proteção efetiva da produção independente das oscilações cambiais. Para isso, um trabalho comum entre YPF e Petrobras na produção e extração de petróleo off shore no Atlântico pode ser um passo importante, acompanhado de planos energéticos mais amplos com vistas a uma acumulação de longo prazo para o conjunto da Unasul.

O outro campo significativo é o chamado combustível proveniente do shale gas (gás de xisto) e do shale oil (óleo de xisto), que poderia converter a região em um provedor internacional de energia. Isso significa ter a tecnologia adequada que, até os últimos três anos, era monopólio do Canadá e dos EUA, mas que pode ser desenvolvida no momento em que a mesma passa a ser rentável conforme os preços internacionais dos combustíveis previstos para a próxima década.

Sustentar em nossos países a taxa de crescimento dos últimos anos é imprescindível para seguir o caminho político da inclusão social e da evolução dos setores médios para um mercado de consumo em expansão.

A reprodução do capital com uma estrutura produtiva que incorpore a valorização de nossos recursos naturais não renováveis é um ponto de apoio fundamental para uma integração regional que tenha por objetivo o desenvolvimento de nossa sociedade, na perspectiva de um plano antropológico cultural de longo prazo.

(*) Mario Burkún é Doutor em Ciências Econômicas da Universidade Pierre Mendes France, de Grenoble, França. Professor de Ciências Econômicas na Universidade de Buenos Aires e na Universidade de La Matanza.

Tradução: Katarina Peixoto

POR QUE BUENOS AIRES ENLOUQUECE A MÍDIA


No Brasil, adivinhe quem deseja mais intensamente o "abismo" de Cristina Kircher?

Fracassarão novamente os que preveem derrota da nacionalização do petróleo. Há nove anos, a Argentina avança – exatamente por desprezar o neoliberalismo

Mark Weisbrot, no The Guardian - Tradução: Antonio Martins, em Outras Palavras

A decisão do governo argentino, de re-nacionalizar a YPF, antiga empresa estatal de petróleo e gás, foi recebida na mídia internacional com brados de ultraje, ameaças, presságios de tormenta e ruína e até xingamentos.

Já vimos este filme antes. Quando o governo argentino entrou em moratória da dívida externa, no final de 2001, e desvalorizou sua moeda algumas semanas depois, choveram lamentos e condenações na imprensa. A medida provocaria inflação descontrolada, fecharia o crédito internacional à Argentina e provocaria ao final escassez de divisas. A economia iria mergulhar numa espiral de recessão.

Nove anos depois, o PIB de Argentina cresceu cerca de 90%, o índice mais alto no hemisfério. Os índices de desemprego estão no patamar mais baixo de todos os tempos; tanto a pobreza quando a “pobreza extrema” foram reduzidas em dois terços. Os investimentos sociais, já corrigidos pela inflação, quase triplicaram. Provavelmente por isso, Cristina Kirchner foi reeleita em outubro, numa vitória arrassadora.

Esta história de sucesso raramente é contada, em especial porque implicou reverter muitas das políticas neoliberais fracassadas que – apoiadas por Washington e pelo FMI – conduziram o país a sua pior recessão, entre 1998 e 2002. Agora, o governo está revertendo outra política neoliberal dos anos 1990: a privatização do setor de petróleo e gás, que jamais deveria ter ocorrido.

Há razões de sobra para esta atitude, e é muito provável que ela se demonstre, também neste caso, acertada. A Repsol, companhia espanhola que controlava 57% da YPF argentina, deixou de produzir o suficiente para abastecer uma economia em crescimento acelerado. Entre 2004 e 2011, a extração de petróleo declinou quase 20%; e a de gás, 13%. A YPF foi a principal responsável pelo recuo. E as reservas comprovadas de petróleo e gás da companhia também caíram substancialmente, nos últimos anos.

O declínio da produção não é um problema relacionado apenas ao consumo das pessoas e empresas, mas, ao mesmo tempo, um tema macroeconômico de grande importância.

O déficit de petróleo e gás levou a uma rápida alta das importações. Em 2011, elas dobraram, em relação aos 9,4 bilhões de dólares do ano anterior, absorvendo boa parte do superávit comercial argentino. Obter um resultado positivo é muito importante para a Argentina desde a moratória de 2001. Como o governo tem pouco acesso aos mercados financeiros internacionais, ele precisa acautelar-se e acumular um volume importante de divisas, para evitar uma crise no balanço de pagamentos. É por isso que não pode dar-se ao luxo de deixar nas mãos do setor privado a produção e distribuição de energia.

Por que, então, o ultraje contra a decisão de Buenos Aires de assumir – por meio de uma troca forçada – o controle de uma empresa que, durante a maior parte de sua história, foi a companhia nacional de petróleo? O México nacionalizou seu setor petrolífero em 1938 e – como diversos países da OPEP – sequer permite investimento estrangeiro na extração. A maior parte dos países produtores – da Arábia Saudita à Noruega – tem estatais petrolíferas. A privatização do óleo e do gás nos anos 1990 foi uma aberração de neoliberalismo selvagem. Mesmo quando o Brasil privatizou empresas estatais avaliadas em U$ 100 bilhões, nos anos 1990, o governo de então manteve-se como acionista majoritário da Petrobrás.

O controle soberano sobre os recursos energéticos tem sido uma parte importante da recuperação econômica da América Latina, vista por muitos como sua “segunda independência”. A Bolívia renacionalizou sua indústria de hidrocarbonetos em 2006, e elevou a receita advinda de suas fontes energéticas de 10% do PIB para 20%. No governo de Rafael Correa, o Equador ampliou progressivamente o controle sobre seu petróleo e sobre as empresas privadas que atuam no setor.

A Argentina, portanto, está se alinhando aos vizinhos e revertendo antigos erros no setor de energia. Já seus detratores estão em posição frágil para atirar pedras. As agências de avaliação de risco estão ameaçando rebaixar a Argentina. Seria o caso de levá-las a sério, depois de elas terem atribuído notas AAA para as hipotecas baseadas em créditos podres, durante a bolha imobiliária? E de terem, mais tarde, fingido que o governo dos EUA poderia tornar-se insolvente? Já as ameaças da União Europeia e do governo de direita da Espanha partem de um continente que vive a segunda recessão em três anos e está a meio caminho de uma década perdida, com índices de desemprego que chegam a 24%, precisamente no estado espanhol.

É interessante notar que a Argentina alcançou um notável sucesso dos últimos nove anos embora recebesse pouquíssimo investimento direto externo e de ter sido afastada, em grande medida, dos mercados financeiros internacionais. Segundo a maior parte dos jornais de negócios, estes são os dois agentes que qualquer governo mais precisa agradar, se quiser ser bem-sucedido. Porém, Buenos Aires tem outras prioridades. Talvez seja por isso que a Argentina recebe tantas críticas…

* Mark Weisbrot é co-autor do Centro para Pesquisa Econômica e Política (CEPR), em Washington. Também é co-autor de Ao Sul da Fronteira, documentário dirigido por Oliver Stone. Em 28 de março, a Folha de S.Paulo, que reproduzia a cada duas semanas alguns de seus textos, interrompeu a publicação, sem oferecer motivos aos leitores

FESTA NUM PAÍS DIVIDIDO




Comemoração da Revolução dos Cravos, em Portugal, escancarou o descompasso entre discurso oficial e sentimento popular: tensão está no ar

Antonio Barbosa Filho, correspondente na Europa – Outras Palavras

PORTO — Quem acompanhou as comemorações dos 38 anos da Revolução de 25 de abril em Portugal, conhecida como “Revolução dos Cravos”, viu duas faces muito diferentes, quase opostas, do mesmo país.

No plenário da Assembleia da República, em Lisboa, viu-se uma sessão solene com as presenças do presidente Aníbal Cavaco Silva e do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, mas com as ausências da Associação 25 de Abril, formada pelos militares que fizeram a Revolução, e do ex-presidente Mário Soares, um dos responsáveis pela consolidação democrática que se seguiu ao levante pacífico das Forças Armadas contra a ditadura salazarista. Nas ruas, o povo apropriou-se da efeméride e transformou as comemorações em manifestações de protesto.

Deve ter sido constrangedor para Passos Coelho ouvir os deputados dizerem — como José Luis Ferreira, do Partido Ecológico, os Verdes — que “o governo não está cumprindo com os ideais de Abril e a Constituição em vigor”. Cecília Honório, do Bloco de Esquerda, expressou que “a direita (no poder) ataca o 25 de Abril e a Democracia” com suas políticas recessivas. Ouviram-se murmúrios no plenário quando ela afirmou que “a direita alimenta um sentimento sanguinário de vingança contra o Estado social”, e fez de Portugal um “colonato do governo alemão sob a batuta autocrática da Sra. Merkel”.

O representante do Partido Comunista, deputado Agostinho Lopes, também bateu forte — e incluiu os socialistas nas origens do problema, pois o Partido Socialista (PS) foi um dos que assinaram o pedido de “ajuda” feito à União Europeia. De acordo com Lopes, os partidos que se alternaram no poder desde 1974 (PS, PDS e CDS) “subscreveram um pacto de traição aos portugueses” ao aceitarem o “socorro” da troika — grupo formado pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI. Restou ao representante da coligação governista CDS-PP, Hélder Amaral, dar uma resposta aos militares e ao socialista Mário Soares, figura nacionalmente reverenciada, por sua recusa a participarem desta sessão comemorativa: “Quem nos dá licença para estarmos aqui é o povo, e não qualquer entidade ou qualquer político.” E acrescentou que a Assembleia da República é “uma casa de Abril, e por isso o 25 deve ser comemorado aqui”.

Pelo Partido Socialista, o deputado Carlos Zorrinho disse que o atual governo português foi um dos primeiros a aliar-se com “as visões extremistas que corroem a Europa (…) e parece querer dispensar a memória do 25 de abril”. Anunciou que o PS fará uma “ruptura democrática com quem ouse destruir em apenas uma legislatura o que levou quatro décadas a adquirir”, referindo-se ao desmonte do Estado social. E inseriu em seu discurso um alerta: “a vitória de François Hollande na França quebrará o eixo neoliberal na Europa”, abrindo possibilidades de novas alternativas de solução à crise. “É possível ajustamento econômico sem empobrecimento geral”, afirmou.

O esperado discurso do presidente Cavaco Silva frustrou a todos: ele gastou 90% do tempo falando da projeção de Portugal no mundo, com atletas que venceram competições importantes, cientistas que se destacaram, arquitetos que ganharam prêmios internacionais. Quando tratou superficialmente da crise que martiriza o país, foi para dizer que os portugueses hão de vencê-la unidos, e que o mundo reconhece que Portugal cumpre seus compromissos. Chegou até mesmo a citar que o país tem sido elogiado por estar fazendo até mais do que o acordado com a troika.

O discurso de oito páginas recebeu críticas gerais e foi timidamente defendido pelas bancadas governistas. O deputado Francisco Louçã, coordenador do Bloco de Esquerda, afirmou: “É surpreendente que (o presidente) não se tenha lembrado do que disse há um ano sobre o limite dos sacrifícios”. E Jerônimo de Souza, secretário-geral do PS, foi irônico: “Cavaco Silva falou do cisco e esqueceu o elefante.” Na opinião geral das ruas, o discurso do presidente foi visto como, no mínimo, infeliz. Embora se dissesse consciente da situação, Cavaco Silva pareceu distante do drama vivido pelo povo português.

Nas ruas, outro país

Fora dos salões e discursos oficiais, o que se observou nas principais cidades e em quase todas as partes foi um 25 de abril de protestos contra o governo, os acordos com a União Europeia e a banca. O tom variava do auto-flagelo — do tipo “a culpa é nossa, do povo, porque gastamos demais, tivemos vidas de ricos, e agora é a hora de pagar a conta” — até a revolta mais exacerbada, dos que desejam uma mudança radical na administração, ruptura com a União Europeia (deixando até o euro como moeda) e uma volta ao princípio do processo revolucionário de 1974.

Mesmo os mais conformados com as medidas recessivas acham que o governo está exagerando, e que os portugueses não suportam mais o empobrecimento geral. Na Praça da Liberdade, no Porto, onde concentraram-se cerca de 5 mil pessoas para gritar slogans como “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”, um ex-militar de 71 anos conta que tem um filho de 35, engenheiro com MBA, e uma filha de 30, professora de Letras que fala vários idiomas, ambos desempregados. “Os empregadores acham que eles têm currículo muito elevado, e que não podem pagar o que valem. Estamos assim: quem não tem estudos, não consegue emprego por isso; quem tem boa formação, paga por ter-se preparado. O desemprego é nosso maior flagelo”.

Sem querer identificar-se (“ponha aí Capitão Gonçalves, há muitos Gonçalves por aí”), o velho oficial, que estava na Guiné-Bissau quando ocorreu o golpe contra a ditadura, está indignado com a corrupção dos governantes, e acha que muita gente ficou viciada nos benefícios sociais concedidos em Portugal às custas dos recursos recebidos da Europa no período de integração do país ao bloco. “Gastamos mal e muito mais do que podíamos, agora é a hora de nos ajustarmos ao que somos, um país pobre”, afirma.

Mesmo achando que a Revolução e os governos que se seguiram cometeram muitos erros, o “capitão Gonçalves” é afirmativo ao dizer que o maior benefício trazido pelos cravos foi “a liberdade que temos de nos expressar, de criticar e expor ideias. Antes, em qualquer reunião, havia um agente da PIDE ou da Polícia Judiciária que podia convidar um cidadão a acompanhá-lo a uma delegacia ou quartel. E muitos desses nunca mais voltaram”.

A impressão que fica deste 25 de abril (comemorado em dois níveis diferentes, o oficialesco e o verdadeiro, nas ruas) é que o processo político português tende a acelerar-se. Ou o governo toma uma posição menos arrogante e tenta um diálogo com a sociedade organizada, cedendo em algumas medidas que castigam fortemente o poder aquisitivo, o emprego e os serviços sociais; ou corre o risco de uma convulsão social. Tenho usado a palavra “perplexidade” para definir o estado de espírito que se percebe nas conversas com cidadãos e cidadãs de vários níveis e setores sociais. Mas ela não abrange todo o sentimento das pessoas: a perplexidade paralisa, mas o que se vê é uma tensão latente. Parece que a população está passando da fase da dúvida e do medo para um sentimento de urgência em fazer algo. Ainda é incipiente, mas, se compartilhada pelas massas, essa sensação pode derivar em incontrolada rebelião, de um momento para outro.

Há tempo para os burocratas de Bruxelas — que falam em nome da União Europeia e do FMI — refletirem sobre os riscos de uma explosão social em Portugal. Caso os socialistas vençam as eleições na França, como indicam as pesquisas até o momento, muita coisa vai mudar, e a ortodoxia financista perderá uma batalha: os países mais endividados e sacrificados vão sentir-se mais fortes para exigirem auditorias, recusarem pagamentos extorsivos e repudiarem medidas ainda mais recessivas. Portugal pode ser um ponto de inflexão nas práticas neoliberais repetidas, e que em lugar algum resultaram em benefício para os países. Veja-se a Irlanda, a Grécia, a Islândia, e outros que fizeram seus “deveres de casa” com todo rigor e continuam pendurados. O discurso do aperto do cinto está cansando e quem sabe Portugal seja o primeiro a rompê-lo. Com mais ou menos trauma.

MANIFESTO SOBRESSALTO




Fernanda Câncio – Diário de Notícias, opinião

"É altura de os Portugueses despertarem da letargia em que têm vivido e perceberem claramente que só uma grande mobilização da sociedade civil permitirá garantir um rumo de futuro."(1)

"É oportuno tomar uma posição clara contra a iniquidade, o medo e o conformismo que se estão a instalar na nossa sociedade."(2)

"Precisamos de uma política humana, orientada para as pessoas concretas, para famílias inteiras que enfrentam privações absolutamente inadmissíveis num país europeu do século XXI."(3)

"Portugal é já o país da União Europeia com maiores desigualdades sociais."(4)

"Precisamos de um combate firme às desigualdades e à pobreza que corroem a nossa unidade como povo."(5)

"O rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão social, desvaloriza o trabalho."(6)

"A expectativa legítima dos Portugueses é a de que todas as políticas públicas e decisões de investimento tenham em conta o seu impacto no mercado laboral, privilegiando iniciativas que criem emprego ou que permitam a defesa dos postos de trabalho. [...] Exige-se, em particular, um esforço determinado no sentido de combater o flagelo do desemprego."(7)

"As medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem-estar social atingem a dignidade da pessoa humana."(8)

"Sem crescimento económico, os custos sociais da consolidação orçamental serão insuportáveis. [...] Há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos."(9)

"O contrato social estabelecido na Constituição da República Portuguesa foi rompido pelo poder."(10)

"Precisamos de gestos fortes que permitam recuperar a confiança nos governantes e nas instituições."(11)

"Queremos apelar ao Povo português e a todas as suas expressões organizadas para que se mobilizem e ajam, em unidade patriótica, para salvar Portugal, a liberdade, a democracia."(12)

"É necessário um sobressalto cívico."(13)

"Queremos reafirmar a nossa convicção quanto à vitória futura, mesmo que sofrida, dos valores de Abril no quadro de uma alternativa política, económica, social e cultural que corresponda aos anseios profundos do Povo português."(14)

"Façam ouvir a vossa voz. Este é o vosso tempo. [... ] Mostrem que não se acomodam nem se resignam."(15)

(Ímpares: discurso de tomada de posse de Cavaco Silva, 9 de março de 2011; Pares: Comunicado da Associação 25 de Abril, 23 de abril de 2012)

Conclusão: "Com o espírito do 25 de Abril, juntos iremos vencer. Obrigado." - Cavaco Silva, 25 de abril de 2012.

E QUE TAL APRENDER COM PASSOS COELHO?




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

O economista e vencedor do prémio Nobel, Joseph Stiglitz, afirma que a Europa está numa situação complicada devido às medidas de austeridade que estão a empurrar o continente "para o suicídio".

Vê-se bem que o homem não percebe nada da matéria. Bastar-lhe-ia falar com o primeiro-ministro de Portugal para perceber que, afinal, é exactamente ao contrário.

Tão ao contrário que o governo português já não aplica a austeridade a cidadãos como António Mexia, presidente executivo da EDP, que recebeu uma remuneração 1,04 milhões de euros no ano passado, um valor em tudo semelhante ao auferido em 2010.

Tão ao contrário que o governo português já não aplica a austeridade a cidadãos como Cavaco Silva, Joaquim Pina Moura, Jorge Coelho, Armando Vara, Manuel Dias Loureiro, Fernando Gomes, António Vitorino, Luís Parreirão, José Penedos, Luís Mira Amaral, António Castro Guerra, Joaquim Ferreira do Amaral, Filipe Baptista, Ascenso Simões, Faria de Oliveira ou Eduardo Catroga.

“Nunca houve um programa de austeridade bem sucedido num país grande", declarou ontem o economista aos jornalistas, em Viena, e hoje citado hoje pela agência Bloomberg.

Aí está uma colossal diferença. Portugal é um país pequeno e, ao contrário dos grandes, tem a vantagem de um dia destes ser resgatado do fundo e emergir ali para os lados do Norte de África.

Se a Grécia fosse o único país europeu a aplicar medidas de austeridade, os responsáveis europeus poderiam ignorá-lo, considerou Stiglitz, "mas com o Reino Unido, a França e todos estes países a sofrer a austeridade é como se fosse uma austeridade conjunta e as consequências económicas vão ser duras".

Nada disso. Joseph Stiglitz deveria reparar que Passos Coelho disse (ainda não era primeiro-ministro, mas foi com isso que lá chegou)“aceitarei reduções nas deduções no dia em que o governo anunciar que vai reduzir a carga fiscal às famílias. Sabemos hoje que o Governo fez de conta. Disse que ia cortar e não cortou. Nas despesas correntes do Estado, há 10% a 15% de despesas que podem ser reduzidas”.

Embora os líderes da zona euro "tenham percebido que a austeridade por si ó não funciona e que é preciso crescimento", não houve ações nesse sentido "e o que acordaram fazer em dezembro é uma receita para garantir que vai morrer", afirmou Joseph Stiglitz referindo-se ao euro.

E acrescentou: "A austeridade combinada como os constrangimentos do euro é uma combinação fatal".

Stigltiz admite uma zona euro de "um ou dois países", constituída pela Alemanha e possivelmente a Holanda e a Finlândia, como "o cenário mais provável se a Europa mantiver a abordagem de austeridade" que levará a altos níveis de desemprego, como o de Espanha que atinge 50 por cento nos jovens desde a crise de 2008, "sem esperança de melhorias nos próximos tempos".

"O que estão a fazer é destruir o capital humano, estão a criar jovens alienados", alertou Joseph Stiglitz. Será que essa dos jovens alienados era dirigida a Passos Coelho? Fica a dúvida para uns e a certeza para a maioria.

Para impulsionar o crescimento os líderes europeus terão, segundo Joseph Stiglitz , de redirecionar as despesas públicas para "utilizar ao máximo" instituições como o Banco Europeu de Investimento e introduzir impostos que melhorem o desempenho económico.

Para que Joseph Stiglitz não continue a dizer asneiras, aui fica parte da receita de Passos Coelho: “Vamos ter de cortar em gorduras e de poupar. O Estado vai ter de fazer austeridade, basta de aplicá-la só aos cidadãos. Ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam. Os que têm mais terão que ajudar os que têm menos”.

Ou ainda, “queremos transferir parte dos sacrifícios que se exigem às famílias e às empresas para o Estado. Já estamos fartos de um Governo que nunca sabe o que diz e nunca sabe o que assina em nome de Portugal”.

Mas também,“se vier a ser necessário algum ajustamento fiscal, será canalizado para o consumo e não para o rendimento das pessoas. Se formos Governo, posso garantir que não será necessário despedir pessoas nem cortar mais salários para sanear o sistema português”.

Além do mais, “já ouvi o primeiro-ministro dizer que o PSD quer acabar com o 13º mês, mas nós nunca falámos disso e é um disparate.”

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.


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